Etarismo

“ É difícil abordar um determinado tipo de preconceito se a discussão aludir como defesa em causa própria. Mas fica a pergunta: quem discutirá o etarismo? O jovem que via de regra não acredita que deixará de ser jovem? O adulto jovem preocupado com sua afirmação na sociedade? Ou aqueles com mais idade que sentem de alguma forma a presença do preconceito? Frente a esse dilema me livro de qualquer hesitação e ponho em pauta essa discussão, incipiente no meu ponto de vista e que continuará sendo se não houver estímulo ao debate”.

Ao se pesquisar sobre etarismo, vocábulo que se refere à discriminação contra pessoas mais velhas se encontra o termo 'vetustez', palavra em desuso que significa velhice e também pode estar relacionada à senilidade. Me ocorre que o desuso deveria também acontecer com o termo etarismo não apenas a prescrição da palavra, mas principalmente do preconceito. O que se evidencia nos dias de hoje, no entanto, é o fortalecimento da intolerância contra pessoas com idade mais avançada.

Esse tipo de violência está presente e enraizado em todas as classes sociais independentemente do local onde é praticado seja no seio familiar, em comunidades ou em serviços públicos e privados. Em todas as situações o etarismo gera nas pessoas uma forte sensação de impotência e até mesmo de revolta seja pelo ato em si ou pela ausência de cumplicidade de quem o faz parecer normal.

O primeiro contato com esse tipo de discriminação surge repentinamente e os registros são quase sempre velados, sinuosos e disfarçados. Invariavelmente quem sofre o preconceito olha para os lados procurando alguém que lhe pareça com mais idade até perceber que é consigo mesmo. A primeira reação é de bloqueio pois não se reconhece como velho (a), mas na reflexão da noite mal dormida se dá conta de que uma nova fase da vida, negada, ignorada ou esquecida está tendo início.

Aos poucos, sinais dissimulados do preconceito vão se tornando frequentes e passam a ser perceptíveis nas atitudes mais corriqueiras. Em geral são aplicados com certa naturalidade pois os que o praticam tentam passar a ideia que se trata de respeito, excesso de cuidado ou carinho: - Estenda o bracinho que a injeção não vai doer nadinha - fique sentadinho que o médico já vem - frases comuns e sempre acompanhadas de falsa compaixão. Se entendidas como preconceito sentenças como estas geram desânimo e apatia em quem já convive com esse tipo de violência há mais tempo, porém nos neófitos costumam causar espanto e perplexidade.

Ao se explorar a internet - ops !! - é fácil encontrar frases utilizadas para valorizar idosos ou como se gosta de falar “a melhor idade”. Existem inúmeras delas escritas por personagens famosos, como a tolice mencionada, não sei se em ensaio ou poema, por Carlos Drummond de Andrade. “Há duas épocas na vida, infância e velhice, em que a felicidade está numa caixa de bombons”, uff!! Até os aclamados gênios têm seus momentos de pouca inspiração!!!

É óbvio que o envelhecimento é uma condição inerente à vida e ignorá-lo como um processo natural é um comportamento no mínimo insensato, porém é surreal admitir ser necessário lembrar, aconselhar ou advertir aos que costumam praticar preconceito etário hoje que eles sofrerão no futuro da mesma intolerância que praticou no passado.

Por tudo isso é importante trazer esse tema à pauta de discussão, diariamente se necessário, para conscientizar a sociedade de que essa atitude é leviana, inadmissível e mais cruel ainda num mundo em que a expectativa de vida só tende a aumentar expondo um número cada vez maior de pessoas à bestialidade desse tipo de preconceito.

FCintra
Enviado por FCintra em 25/04/2023
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