Em pleno século XXI e...
Sempre que leio a frase que começa “Em pleno século XXI... e ainda há pessoas que fazem guerras... que são preconceituosas, etc.” sei que estou diante de alguém que acredita no progresso moral dos homens e mulheres. Seria isso ingenuidade ou má-fé? Não sei, prefiro apenas desdenhar de tal pensamento.
Não é preciso ser um historiador renomado, um filósofo gabaritado, ou qualquer outro especialista em humanas para entender que toda época tem os seus avanços e retrocessos, e que acreditar que um século é moralmente superior ao outro é a coisa mais estúpida que alguém poderia pensar e acreditar.
Quando sou questionado sobre o que penso da atual geração, a minha resposta costuma ser simples e concisa: é uma geração como todas as outras, porém com problemas contemporâneos! A diferença não está no grau qualitativo, no meu modo de ver, a diferença está no grau quantitativo.
Hoje a trama humana tem “audiência”, é divulgada e compartilhada nas redes sociais, audiência tal que os nossos antepassados não tiveram acesso. Hoje um estúpido tem milhões de seguidores, um idiota é imitado, um imbecil é referência de pensamento, um humorista ganha milhares, ou até mesmo milhões, de reais falando coisas que os nossos antepassados falavam numa roda bem restrita de amigos. É impossível não levar em conta os números para analisar a nossa atual geração. A população aumentou absurdamente no último meio século, isso para fincar uma mensuração, como não entender que automaticamente o número de imbecis aumentaram consideravelmente? Quando, no passado, um imbecil queria público, este tinha um número bem restrito de espectadores, na pior das hipóteses, tinha o próprio espelho para proliferar as suas peripécias.
A quantidade de imbecis mais o imenso avanço tecnológico que tivemos nas últimas décadas fizeram com que o foco mudasse para o problema geracional e não para o rápido avanço tecnológico em detrimento do avanço moral, e com isso, passou-se a falsa ideia de que por vivermos numa sociedade evoluída tecnologicamente, automaticamente seríamos uma sociedade moralmente superior as demais. E com isso, passou-se a confundir “pensamento raso” com “livre pensamento”, “avanço tecnológico” com “avanço moral”, “aumento de informações” com “aumento de críticos intelectuais”. A facilidade de pesquisar no Google “o que é tal coisa” mais a resposta rápida em detrimento do deleite demorado de um livro sobre tal assunto, fez com que confundíssemos informação com conhecimento, e logo, passou-se também a acreditar que temos mais conhecimento que os maiores e melhores homens e mulheres do passado. Daí o motivo de existir hoje tantos jovens “especialistas” em assuntos que jamais se debruçaram demoradamente. Hoje a resposta está num clique, e não na reflexão demorada e meditativa.
Não, não somos moralmente superiores a nenhuma outra geração, é inegável que temos avanços e retrocessos, como todas as épocas também tiveram, porém, hoje estamos conectados, e quando temos uma “coisa” maravilhosa, como o avanço tecnológico que beneficia tanto gênios como imbecis, inevitavelmente essa grande coisa maravilhosa será usada de maneira imbecil, de novo, trata-se de uma questão quantitativa, os imbecis sempre serão maioria. Afinal de contas, como diz o professor Luiz Felipe Pondé: “os homens não são iguais – os poucos melhores sempre carregaram a humanidade nas costas”.
Vale salientar, a título de conclusão, que não há nada mais imoral do que julgar a imoralidade do passado com a moral que se tem hoje. Cada época teve os seus dogmas, os seus pecados e as suas virtudes, algumas numa escala maior do que em outras épocas, porém não houve tempo em que não existiu grandeza e baixeza simultaneamente. Não existe uma linha moral do tempo em ascensão, nem mesmo uma linha moral em declínio total. Toda época tem os seus grandes homens e mulheres e os seus canalhas e tiranos. Assim como a “idade das trevas” teve as suas luzes, também a “idade das luzes” também teve as suas trevas. Ignorar isso, ou é canalhice ou ignorância. Vale um adendo, sempre achei cômico o fato de uma era posterior julgar como “idade das trevas” uma época anterior a sua e consequentemente uma era inteira ser intitulada de “idade das luzes”, talvez fosse o reflexo do sol que reluzia nas lâminas afiadas das guilhotinas das revoluções iluministas que cegou tais homens. Sem dúvida, a prepotência humana é universal.
No mesmo instante em que alguém covardemente tira proveito de outrem, em algum lugar alguém está corajosamente dando a vida por outras pessoas. Não se trata de qual momento da história você está inserido, trata-se de qual atitude e escolha irá tomar perante aquilo que as circunstâncias lhe impõem ou impuseram. Como disse Viktor Frankl em seu magnífico livro “Em Busca de Sentido”, nos campos de concentração ele viu homens e mulheres respondendo ao trama da vida de diferentes formas, cada um à sua maneira, cada um à sua grandiosidade ou baixeza. Como bem disse Winston Churchill “se você está atravessando um inferno, continue atravessando”. E foi isso que fez Viktor Frankl.
Em meio o inferno que foi o holocausto, até ali foi capaz de resplandecer a luz de grandes homens e mulheres. Não espere a época, não espere o avanço moral de uma sociedade, trabalhe a sua mente, trabalhe a sua capacidade e força. Somente você pode mudar a história. Se mudar a sua história, já terá feito coisas extraordinárias. A maioria não consegue ser senhor de si, que dirá da história...
Em pleno século XXI e ainda há pessoas que acreditam no progresso moral da humanidade.
Finalizo novamente com uma provocação do professor Pondé: “A vida não é para iniciantes”.