Acidente anunciado
O relato do acidente anunciado que aqui faço poderia acontecer em qualquer um dos calçadões para prática esportiva e de caminhada tão comuns hoje nas cidades de médio e grande porte do País. Por esse motivo não vou declarar a cidade a que o texto se refere.
A ausência de cidadania e o desrespeito ao próximo é, infelizmente, muito comum em todos os cantos do País. Costumo me render à epifania de que um dia as pessoas serão sempre gentis, respeitarão as diferenças interpessoais, o espaço ocupado pelos demais e as leis e normas em vigor. A seguir faço a previsão de um acidente anunciado plagiando o título do livro de Gabriel Garcia Marques. Peço desculpas, mas não consegui encontrar outra denominação mais apropriada.
Sou praticante assíduo de caminhadas no "calçadão da minha cidade" no horário das 17:00 horas. Nesse horário o fluxo de pessoas cresce exponencialmente, assim como a circulação de ciclistas seja para uso esportivo, seja daqueles que transitam após o trabalho e ao retorno de suas casas.
Nesse horário, em praticamente todos os dias, o prazer da caminhada corre o risco de se transformar em drama pessoal e familiar para os usuários desse espaço. Essa área que, em tese, deveria ser um local para puro relaxamento, infelizmente, não tem sido pelo estresse a que somos submetidos em virtude do desrespeito dos ciclistas (esportistas e trabalhadores), que teimam em não utilizar o espaço que lhes é reservado.
Relato:
1. Às 17:00 h, as bicicletas circulam em alta velocidade pelas áreas de pedestre do calçadão como se não existisse ciclovia e, qualquer iniciativa de reclamação é encarada com desdém e muitas vezes com raiva. A seguir descrevo um momento que vivenciei:
Caminhava na calçada construída para realização das caminhadas e, distraidamente, mudei de direção sem olhar para trás (note-se o absurdo da obrigatoriedade). Nesse momento um ciclista em alta velocidade e usando celular tirou um fino em mim e freou bruscamente: não fui atropelado por pouco. Reação do ciclista: "Quer morrer velho idiota. Olha por ande anda seu p.". Efeito sobre mim: "completamente paralisado, impotente, sem reação e, em seguida, acometido por uma imensa tristeza”.
2. Além do padrão quase convencional de desrespeito às normas, percebe-se também, claramente, a ausência do Poder Público no cuidado com a população. É possível notar que a delimitação da ciclovia desaparece em alguns lugares e quase não existe sinalização visível, tanto no chão como em postes ou similares. Esse fato servirá, naturalmente de desculpas no caso de acidentes. Em parte da ciclovia raramente se vê um ciclista circulando por ser muito perigosa pois, além do revestimento irregular, a ciclovia fica ao lado da pista de veículos e sem qualquer proteção para evitar que algum descuido se transforme em acidente fatal.
3. O calçadão é frequentado por todo tipo de público: idosos, pessoas com mobilidade comprometida, deficientes físicos, grávidas, crianças e demais pessoas. Naturalmente os riscos para os idosos, pessoas com dificuldade de locomoção, deficientes físicos, grávidas e crianças é muito mais alto pois o tal acidente anunciado, se acontecer, os efeitos poderão ser dramáticos.
4. Quanto à “fiscalização” existe sim, porém, a mais simples observação verificará que o fiscal está comprometido apenas com seu celular e, quando desvia o olhar da tela é indiferente a qualquer arbitrariedade cometida. Aparentemente, não respeitar os limites da ciclovia é considerado normal pelos que estão ali para “fiscalizar” e, incluo neste grupo, a Guarda Municipal que, quando presente, é indiferente ao que se passa, como se tudo (trânsito conjunto de pedestres e bicicletas na mesma área) estivesse na mais completa normalidade.
Gostaria de chamar a atenção mais uma vez para o “acidente anunciado” do título pois estou convicto de que se nada for feito nos calçadões da minha e de muitas outras cidades, em pouco tempo se terá registrado uma ou várias ocorrências de grande gravidade. Espero que isso não venha a acontecer, mas a probabilidade é muito alta, infelizmente.
P.S. Esse texto foi enviado primeiramente para uma estação de TV como sugestão para avaliação da denúncia e, se fosse considerada relevante, fazer entrada no tema em telejornais. Não houve resposta.
Em um segundo momento foi enviado para a Ouvidoria da Prefeitura Municipal. Houve retorno sobre o recebimento da mensagem e do encaminhamento que foi dado. Notei que passou por vários setores e por várias mãos. No entanto parou por aí.