Chá da Cesta – 7 - B: de onde?
De onde é originária a planta?
Na mesma linha de pensamento Victor H. Mair escreve: “a região nativa exacta do chá tem feito correr tinta até agitado diversos orgulhos nacionais, porém, os botânicos situam actualmente o centro da distribuição natural do chá nos cursos superiores do rio Bramaputra na Índia na Província do Assam, no norte da Birmânia e da Tailândia, Indochina, e sudoeste da China” ou até mesmo no Nepal, pois, em 1788, Sir Joseph Banks assinalou a sua existência nas Colinas do Nepal.”
A variedade Sinnensis cresce espontaneamente no sul da China e, buscando condições edafoclimáticas preferenciais, “ocorre em florestas, bosques, espaços arbustivos, ladeiras rochosas e secas, encostas pedregosas e, podendo resistir a breves períodos de geada, pode ser cultivado em altitudes elevadas como em Darjeeling (no sopé dos Himalaias), nas montanhas da Formosa ou na região central do Sri Lanka (antigo Ceilão). Por seu turno, a variedade Assámica, mais melindrosa, cresce espontaneamente em regiões mais húmidas e menos agrestes do sudeste asiático, sendo cultivada na China, Assam e Ceilão.”
Concluímos que “(…) a pátria do chá é habitada por um largo número de diferentes povos: os Hani, Yi, Dai, Bulang, Wa, De”ang, e muitos outros – muitos dos quais mantiveram processos antigos de colheita, de preparação e de consumo da folha do chá.” Havendo indícios de que o chá crescia espontâneo em vários pontos da Ásia anteriormente referidos, a conclusão acerca deste ponto deve ser prudente: por tudo o que ficou expendido, a discussão deve permanecer em aberto.
Um compatriota de Hasimoto, Sen Soshitsu XV, em trabalho publicado em 1996, não se dá por convencido com a hipótese do compatriota. Diz ele: “Em última análise, contudo, não existe prova de que o chá tenha sido levado para a China ou que crescesse aí espontaneamente como uma planta selvagem.” O Chinês Wu Juenong, Presidente Honorário da Sociedade Chinesa do Chá, com quem Hasimoto esteve em Março de 1982, estuda o chá em profundidade a partir de 1979. Citando Hasimoto, partilha a tese de um local original do chá na China, mas admite que é uma matéria na qual os estudiosos estão ainda a trabalhar.
O próprio Hasimoto, apesar de todo um caminho desbravado mostra que outro tanto fica por desbravar e adverte que há outros pontos a considerar: “(…) research on the origin of tea plant must include consideration of the History of population migration, and the time, place, and nationality of wild’s tea first cutivators and drinkers.”
Reparo a ter em atenção: Se a China actual deriva da primeira unificação levada a cabo em 221 a.C., atribuir o chá antes daquela data à China ou a qualquer dos países limítrofes actuais, não será o mesmo que considerar Viriato como sendo Português só pelo facto de, ao que se sabe, ter vivido em parte do território que muitos séculos depois viria a ser Portugal? China e Chineses, devemos ter em conta, é uma identificação europeia de quem se considerava como Han. Cultural e linguisticamente, a área inicial do chá manteve-se, até, pelo menos, ao século XIII d. C., distinta do Norte.
Quem foram os primeiros a usar o chá como bebida e a cultivá-lo? Segundo o Chinês Wu Juenong, não parecem restar dúvidas de que foram os Chineses. Quando se começou a consumir chá cultivado por mãos humanas? É Hasimoto, sem adiantar provas, quem no-lo afiança: há mais de dois mil anos na China. Esta data é actualmente corroborada pela arqueologia. Em 2016, foi divulgada na Scientific Reports 6 a notícia de que fora encontrado chá no mausoléu do Imperador Jing da dinastia Han, o qual morreu em 141 a.C. Trata-se, segundo os seus autores, Prof. Dorian Fullere e Dr. Yang Xiaoyan, do testemunho mais antigo encontrado até ao momento, o que os leva a admitir que o chá (Camellia Sinensis) era consumido pelos imperadores daquela dinastia já no século II a.C.
Mas, atenção, como aconteceu recentemente à história da origem do cacau, devemos deixar em aberto a resposta final para a origem do chá. O artigo, cruzando provas arqueológias e biológicas, “conclui que a domesticação do cacau terá acontecido 1500 anos antes do que se pensava e, afinal, tudo se terá passado na América do Sul e não na América Central.”
As provas documentais da origem do chá não são unanimemente aceites. Sen Soshitsu XV indica o ano de 59 a.C., no reinado do Imperador Xuandi, apoiando-se numa passagem do livro Tongyue, que trata de um contrato de um escravo. Soshitsu não tem, ainda assim, a certeza de se tratar de uma referência ao chá, já que o ideograma aí usado para chá suscita algumas dúvidas. Wu Juenong adianta diversas referências que considera históricas, sendo a mais antiga uma passagem do Shennong’s classic of food: “The frequent drinking of tea invigorates the spirit and eases the mind and body.” José Amaral Duarte, em 2001, defende que a primeira referência ao chá será a que consta num dicionário antigo – O Rhia – datado do século III a.C., ao qual foi acrescentado, no séc. IV, o Kuang-Ya, que consagra um capítulo especial ao chá.
Mário Moura
Doutor em História do Atlântico
Universidade dos Açores
Lugar Areias, Rabo de Peixe, Setembro de 2019