Chape e os espíritas

Quando caiu o avião com o time da Chapecoense, há exatamente um ano, foram ouvidas explicações por parte de lideranças espíritas para tão grande tragédia. Boa parte do que eu li dizia respeito à crença de que eventos como esse são “resgates coletivos”.

Não podendo suportar a ideia de que o destino de tantas pessoas tenha sido decidido em um lance do acaso, e precisando conciliar o acidente com a visão de um Deus justo e amoroso, os adeptos da teoria do resgate coletivo passam a culpa da tragédia para a própria vítima: foi ela que, em uma vida passada, aprontou poucas e boas, e agora, merecidamente, está sofrendo a consequência de seus atos malignos.

Junta-se outras pessoas na mesma situação espiritual e voilá: temos uma tragédia de grandes proporções. Em defesa da crença, alega-se que foram os próprios espíritos que disseram, e com isso espera-se anular qualquer possibilidade de questionamento.

Bem, no caso específico do avião da Chapecoense, uma coisa que escapou das análises espíritas que eu li foi a questão do momento que o time vivia. Ora, o time vivia a melhor fase da sua história, e com ele jogadores e técnico. Era o que se poderia chamar de “momento mágico”. Mesmo antes do acidente, a Chapecoense já havia conquistado a simpatia de torcedores de outros times, a ponto de muitos quererem que a Chape fizesse o segundo jogo da final, que não aconteceu, no próprio estádio dos seus times. O time parecia ter sido capaz, antes ainda do acidente, de unir torcedores rivais.

O que explicaria esse momento tão feliz de todos os envolvidos no acidente, uma vez que ele precedia o momento do “resgate coletivo”? Por que foi preciso que todos estivessem na melhor fase de suas carreiras para então serem chamados para pagar o preço de erros passados? Esse foi um ponto ao qual não vi as análises adentrarem, e que diferencia essa tragédia coletiva de outras.

Acaso teria sido um requinte para tornar ainda mais pesaroso o tal resgate? Ou, ao contrário, um meio de torná-lo mais suportável, já que haveria a sensação de dever cumprido? Nesse caso, por que não acontece mais vezes, por que tantas pessoas morrem em acidentes coletivos sem que estejam vivendo um momento especialmente marcante em suas vidas? Perguntas, perguntas.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 28/11/2017
Reeditado em 28/11/2017
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