O Inesperado
Capitulo 2
O Inesperado
Ás quatro horas e cinquenta minutos da manhã do Domingo de Ramos, movia-se sobre o quarto simples o velho Godfriend, seu aposento, lembrava em muitos detalhes algo que remetia as celas monásticas, constando apenas uma cama de solteiro, ao que parece de madeira nobre, feita á mão com pequenos detalhes artisticamente esculpidos na cabeceira do leito, com uma simetria encantadora, uma cruz celta com seus lados iguais e seu circulo bem trabalhado no centro da cruz, refletia o ideal cristão celta anglo-saxônico, a simplicidade não queria dizer ausência de arte, pois em tudo e em todos os cantos da sua residência pulsava diversificadamente a compleição da arte. As paredes bem pintadas com uma tonalidade marfim maple, faziam contrastes com molduras de quadros pintadas em dourado emoldurando obras artísticas herméticas, no canto esquerdo um criado mudo de uma madeira bastante escura, brilhava fortemente ao ser banhada pelo ensaio dos primeiros raios de luz, àqueles raios de luz que antecedem a chegada do grandioso sol amarelado, sobre o criado uma jarra contendo água e um copo longo, ainda com água pela metade, um cubo de mármore preto, em cada lado do cubo símbolos que pareciam serem matemáticos e alquímicos, havia uma pequena mesa no canto recuado com alguns papeis bem ordenados, livros sobrepostos um ao outro, uma antiga caneta com um belo tinteiro, um bloco de notas e um notebook aberto, porém desligado. No outro canto, mais ao fundo do quarto um guarda-roupa muito parecido com a cama, pois era esculpido da mesma maneira. No centro do quarto um tapete tamanho médio medindo dois metros de largura por dois metros e cinquenta centímetros de comprimento, sentado bem no centro do tapete estava o Padre, contemplando por sua janela aberta o raiar de um novo dia, sempre dizia: “Vejo todos os dias a maravilha da vida recomeçar, vejo o ciclo da existência recomeçar todos os dias ao contemplar a linda escuridão que se vai, para a vinda do novo dia que vêm, vai as trevas do repouso, para a chegada da luz, da agitação”. A brisa matinal fazia balançar no ipê os vários mensageiros do vento, todos em metal bem afinados que ressoava em conjunto com bem-te-vis, cardeais, papa-capins, canários da terra e vários pardais, começava logo cedo à orquestração sinfônica da natureza, artistas naturais, estes pássaros que eram recebidos com um belo sorriso e viam se alimentar das migalhas que eram expostas propositalmente por Arthorius todas as manhãs.
Com seu sorriso disfarçado no rosto ficava a repetir: “Venham irmãos, cantemos juntos nosso júbilo de alegria...”. Convidando os pássaros junto com ele á cantarolar com boca fechada sons que encantava a alma. Todos seus amigos sabiam deste seu rito matutinal, era como ele orava, era sua prece matinal. Costumava ensinar, sempre que tinha oportunidade e o momento propicio, de que todos são partes integrantes da mesma natureza, pássaros, mas que a sociedade e a cultura moldam gaiolas para aprisionar esse pássaro encantado que a humanidade é, e uma vez engaiolada perde seu espírito natural e passa a cantar artificialmente cantos de dor e escravidão. Cantar cantos mecânicos, não é algo natural que vem do fundo da alma, não é um canto natural e sim um canto forçado, uma lamentação pela prisão imposta pela cultura escravizante.
Ficou ali, sentado em seu tapete na companhia de seus irmãos confrades, os pássaros que cantavam seus cantos encantados, aformoseando o recém-chegado amanhecer, convidando o velho a ser menino outra vez. Permaneceu até ás cinco e trinta da manhã, quando levantou para um brevíssimo e lento alongamento seguido por um profundo exercício respiratório. E assim seguia para o toalete para realizar seu asseio e em seguida dirigir-se a cozinha á fazer seu café da manhã.
Durante a preparação do seu café da manhã uma visita inesperada bate á sua porta, é Magnólia, uma senhora negra, alta, olhos vivos, cabelos bem penteados, com um lindo coque preso ao torço da cabeleira, apresentava-se com um vestido todo branco, feito todo na renda, trazia em mãos uns bolinhos de tapioca fritos e granulados com açúcar e canela, o cheiro podia ser sentido desde a porta da casa até a cozinha. Sorria discretamente o velho padre ao pensar: Lá vem Dona Magnólia.
- Ô de casa!
- Olá, Dona Magnólia, bom dia!
- Bom dia Reverendo, trouxe para o senhor meus bolinhos de estudante.
- Já sabia do que se tratava antes da senhora anunciar sua chegada, o cheiro delicioso dos seus bolinhos adentrou em minha casa antes da tua voz. Dizia alegremente sem conter a alegria e a satisfação de receber em sua casa a Dona Magnólia, uma velha amiga cuja amizade remetia á sua chegada á Bahia.
- Sr. Godfriend, não o vi semana passada! Por onde o senhor andou? Eu e meu marido falamos do senhor para um casal de amigos. Pois eles estão passando por um problema sério, e durante nosso bate-papo sobreveio o seu nome na conversa.
- Falando mal de mim outra vez! Disparava em gargalhar enquanto ia preparando a mesa do café da manhã.
- Telefona para o senhor Pedro, pede para ele vim tomar café agora conosco. Pedia Godfriend educadamente á senhora Magnólia.
Atendo ao pedido do padre, Dona Magnólia manuseava seu celular procurando em sua agenda telefônica o número de seu esposo, ao achar, ligou e com seu jeito baiano convidou seu esposo para o café da manhã na residência do padre Godfriend.
- Alô! Amorzinho, já trouxe os bolinhos de estudante para o nosso velho amigo, e ele pediu para que você venha pra cá é urgente.
- Urgente, nossa senhora, o que deve ter acontecido? Com ar de preocupação, o senhor Pedro se dirigiu á residência do velho padre e amigo.
A mesa já estava posta, podiam sentir o cheiro agradável do café bem passado, do aroma inconfundível dos bolinhos de estudante granulado com açúcar refinado e canela em pó, um bule fumegando e destilando o cheiro de chá mate. Queijo gorgonzola e mussarela, presunto, leite, ovos mexidos, um jarra de iogurte, faziam da cozinha um espaço apropriado para uma bela confraternização entre amigos. Dizia sempre o velho Godfriend que o melhor lugar de uma casa é a cozinha, ali o dizia, podemos transformar elementos culinários em delicias não só para a satisfação do corpo, como também para a realização da alma. Amava ver sua cozinha sempre visitada pelos amigos, desde que sua esposa faleceu há quinze anos, passou a ter os amigos como sendo parte de sua família particular.
Passado uns dez minutos ouviu-se um toque forte na porta, ao que parecia ser de alguém afobado, era o senhor Pedro.
- Olá, sou eu, Pedrinho... Dizia avexadamente, como quem desejava ver logo o velho amigo.
- Bom dia Pedrinho! Sorria abertamente para Pedrinho Godfriend, um sorriso de seja bem-vindo.
- Qual a urgência? Algum problema meu compadre?
- Pelo que sei. Nenhum problema meu caro!
- Mas Magnólia ligou dizendo que era urgente.
- Mas é! Frigia a testa ao sorrir para deixar clara a pegadinha que acabara de cair. Pois há duas semanas a Dona Magnólia e Arthorius haviam combinado de fazer um café da manha surpresa para Pedrinho, pois o mesmo aniversariava naquele exato dia.
- Meus parabéns meus amigo! Que a Graça Maior o ilumine hoje e sempre! Abraçava fortemente o amigo enquanto dizia sua já conhecida benção. E dizia ao ouvido do amigo: “Há amigos que são mais chegados do que irmãos”!
Durante o café da manhã Arthorius alegrava-se com a presença de seus amigos em sua casa, sentia que vivenciava em sua cozinha o espírito daquilo que para ela era entendido ser o espírito de comunhão e fraternidade, via-se em plena união e realizado em alegrar os corações de seus amigos, ainda mais quando se tratava de amigos mais chegados que amigos, o tempo passava lentamente, durante o café matinal os amigos colocaram a conversa em dias, falaram sobre o quê ocorrera durante a semana que se passou, e assim Pedrinho teve seu dia de aniversário bem iniciado.
- Como poderia eu agradecer velho amigo Arthorius, tamanha surpresa?
Gargalhava o velho padre.
- Não sou responsável por nada, tua esposa é a mentora de tudo isto! Só sediei a cozinha... Lembre-se disso meu amigo! Foi minha amiga aqui que pensou em tudo isto, feliz aniversário meu amigo. Como costumo sempre dizer, feliz menos um ano de vida, e viva sabiamente esse menos um ano á menos.
- Nunca me atentei para isso, sempre fui levado a pensar que no nosso aniversário ganhamos um ano á mais – gargalhava Pedrinho.
- Pois é! A vida é regressiva, já nascemos com o relógio girando ao contrário, cada dia é um dia á menos, cada ano é um ano á menos, e assim a matemática existência vai se somatizando não em créditos mais em descréditos.
Arthorius matematizava sua ideias enquanto suavemente sorria ao explicar a lógica existencial e realista da vida. De que ninguém ao aniversariar ganha anos á mais e sim perde um ano á menos, é menos um ano na jornada existencial. Costumava dizer quando alguém perguntava a sua idade: “Arthorius! Quantos anos o Senhor têm? Bem! Eu não sei quantos anos eu tenho, eu sei que dos anos que eu tenho, até agora eu já gastei 70 anos!”.
Depois de um longo abraço em Pedro e em Dona Magnólia, Arthorius retirou-se ao seu escritório, foi ver em suas anotações o que tinha á fazer no dia.
Ao si dá conta em sua agenda de uma anotação que tinha feito, logo lembrou que terei de enviar um e-mail para um amigo na Palestina, referente á compra de alguns livros que tivera encomendado no Egito. Ao abrir seu e-mail, percebeu que o mesmo amigo havia enviado antecipadamente uma correspondência com imagens fotográficas cujas imagens não saiam da sua memória, naquela noite tinha dado inicio o recomeço de uma guerra que já durava dezenas de anos entre Israel e Palestinos, as imagens feriram seu coração, eram fotos de crianças, jovens e adultos mortos por mísseis, que tinham caídos em bairros palestinos, em escolas, hospitais, e compungia o coração do velho padre, seus olhos enchiam de lágrimas e seus lábios balbuciavam em bom hebraico a frase: “שלי האחים” – haahith shali – “Meus irmãos”, não apenas dizia como sentia na alma a dor do que via. Leu o e-mail do seu amigo, percebeu a dor, por detrás de cada palavra, viu a aflição de um amigo que estava vivenciado o terror de uma guerra, procurou ligar a TV, para acompanhar os noticiários e comprovou a veracidade dos fatos ao ver as noticias pelo canal da BBC de Londres via satélite em seu canal á cabo, mais uma vez a guerra estremecia a terra conhecida como Terra Santa, e quem pagavam o alto preço dessa guerra eram aqueles que menos têm á pagar, o pobre, o povo, o palestino. Mesmo diante do colapso desesperador e desumano da guerra desigual seu bom amigo não se esqueceu de lhe enviar os livros tão esperado pelo reverendo, já estavam á caminho, em algumas semanas, estariam chegando no Brasil.
Antes fechar seu e-mail, Godfriend enviou ao seu amigo palestino suas consolações, de imediato ficou sem palavras diante das imagens que chocou seu coração. Preferiu adentrar em seu Oficium e lá meditar em seu profundo silêncio.
Godfriend não era um homem desses de baixa estima, raramente a tristeza fazia parte de sua companhia, ao contrário a alegria formoseava seu rosto, seu dia á dia, entretanto naquela manhã, após o lindo café da manhã, com seus amigos, aquele e-mail, o entristeceu por demais, se tinha algo que o abalara era a desumanização do ser humano, a degradação humana, a demonização do ser humano, costumava sempre dizer – “o homem é demônio mal do próprio homem”, mergulhado em sua meditação, compungido em seu coração em plena dor como se estivesse também sofrendo com os que sofrem, sentia que aquele duro golpe em Israel não tinha sido apenas entre os palestinos apenas, sentia como que de fato, como se tivesse sido entre uns de seus verdadeiros irmãos, Godfriend, sentia um profundo amor por todos, que era tão natural para ele pensar, sentir e entender que quem quer que seja, em sua concepção era de fato seu irmão, nascido do mesmo Pai – Mãe Eterno, Ventre Universal Gerador de todas as coisas, sentia em seu interior a agonia das aflições que afligia os demais.
Sentado em seu tapete, o ar levemente perfumado pelo aroma de jasmim, oriundo dos incensos egípcios e indianos, uma leve corrente de ar circulava sobre o aposento chamado de Oficium, seus olhos fechados, meditava á procura de uma palavra que o aliviasse e pudesse ao mesmo tempo servir de instrumento como balsamo á toar ao seu bom amigo palestino. Durante o período de uma hora e meia enquanto relaxava sua mente, e buscava em seu subconsciente as respostas, as figuras, as imagens, as leituras, sobrevieram uma lembrança, um profeta chamado Jeremias, uma ocasião, o cativeiro babilônico e a humilhação pela qual a população passou por setenta anos durante esse exílio humilhante. Lembrava Arthorius, de um sermão que tinha feito há algumas décadas atrás, algo tinha ficado registrado em seu subconsciente, era justamente o tema do sermão: “Levando à memória aquilo que nos dá esperança”. Lembrava o velho padre Arthorius de Lamentações de Jeremias, capitulo 3, versus 1 ao verso 26. Ao lembrar, Arthorius abriu os olhos e lentamente olhou ao seu redor, respirou calmamente, levantou-se, alongou o seu corpo, dirigiu-se até á sua estante e pegou a sua Bíblia em português, era a versão portuguesa da Bíblia de João Feira de Almeida, da qual passou a reler os versos e relembrar o antigo sermão, sucedeu a leitura:
Lamentações de Jeremias 3 : 1 á 26
3:1 Eu sou o homem que viu a aflição pela vara do furor de Deus.
2 Ele me levou e me fez andar em trevas e não na luz.
3 Deveras ele volveu contra mim a mão, de contínuo, todo o dia.
4 Fez envelhecer a minha carne e a minha pele, despedaçou os meus ossos.
5 Edificou contra mim e me cercou de veneno e de dor.
6 Fez-me habitar em lugares tenebrosos, como os que estão mortos para sempre.
7 Cercou-me de um muro, e já não posso sair; agravou-me com grilhões de bronze.
8 Ainda quando clamo e grito, ele não admite a minha oração.
9 Fechou os meus caminhos com pedras lavradas, fez tortuosas as minhas veredas.
10 Fez-se-me como urso à espreita, um leão de emboscada.
11 Desviou os meus caminhos e me fez em pedaços; deixou-me assolado.
12 Entesou o seu arco e me pôs como alvo à flecha.
13 Fez que me entrassem no coração as flechas da sua aljava.
14 Fui feito objeto de escárnio para todo o meu povo e a sua canção, todo o dia.
15 Fartou-me de amarguras, saciou-me de absinto.
16 Fez-me quebrar com pedrinhas de areia os meus dentes, cobriu-me de cinza.
17 Afastou a paz de minha alma; esqueci-me do bem.
18 Então, disse eu: já pereceu a minha glória, como também a minha esperança no SENHOR.
19 Lembra-te da minha aflição e do meu pranto, do absinto e do veneno.
20 Minha alma, continuamente, os recorda e se abate dentro de mim.
21 Quero trazer à memória o que me pode dar esperança.
22 As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim;
23 renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade.
24 A minha porção é o SENHOR, diz a minha alma; portanto, esperarei nele.
25 Bom é o SENHOR para os que esperam por ele, para a alma que o busca.
26 Bom é aguardar a salvação do SENHOR, e isso, em silêncio.
Sua memória foi rapidamente tecendo as palavras que décadas atrás tinha servido como bálsamo a confortar sua paróquia de outrora e que agora estava sendo arquitetada para um outro novo proposito o de servir como alivio e isentivo a esperança para àqueles que pelo furor da guerra de uma forma similar também vivenciara a mesma humilhação e assim introduzia seu comentário inicial.
“Somos meus caros amigos e irmãos sejam palestinos ou judeus, culpados ou inocentes, convidados à mergulhar no contexto desta leitura, seja eu ou você meu caro irmão ou irmã, correspondente dessa tradição ou não, seja muçulmano ou não, ateu ou não, apenas na condição de humanos é que nos colocamos diante dessa meditação, entendendo ser está humildemente uma palavra dirigida á vós humanos por outro humano como vós, porém com uma plena intenção de que tal palavra se torne algo bem maior do que no instante é ao sair de meus lábios, que encontre em vossos corações a guarida necessária para o bom frutificar. Esta leitura nos remete ao ano de 586 a.C, quando o grande Império da Babilônia invadiu Israel e trouxe angustia à nação israelita. Levando grande parte do povo de Israel como escravo para a Babilônia.
O livro que estamos lendo, mais especificamente o terceiro capitulo, desse livro, intitulado de Lamentações de Jeremias, é na verdade o livro todo, lamentações fúnebres que de forma poética descreve dolorosamente a memória angustiosa dos fatos concretos acontecidos em Jerusalém. Isto não tem acontecido nos dias de hoje? Não tem o povo palestino chorado os seus mortos também? Não tem nos dias de hoje também o grande império do capital ditando as regras do poder, de quem vive, de quem morre? Não tem sido assim durante décadas? Babilônia hoje não está tão viva como nos dias de ontem? Não tem escravizado a humanidade de forma tão temerosa como nos dias do passado? Não lamentamos também nossas perdas, nossas dores, nossas angustias? Nossos mortos? Não se espreme o coração da mãe que perde seus filhos na guerra insana?
Encontramos nesse capitulo em particular o registro das dores, da humilhação e das angustias que tomaram posse de um povo no passado, de uma cultura, de toda uma geração e que pelo visto a história teima em repetir em nosso tempo atual.
Entretanto meus irmãos de dor e sofrimento, não é somente a dor, a angustia, a humilhação que presenciamos nesse texto, diante de tanta desgraça, diante de tanta miséria e dor, diante de tanto sofrimento, acima de tudo, encontramos frente ao desespero da vida, e das perdas a fé, e a esperança como elementos que não foi possível o império acorrentá-los. Acima de todos os males, sobre saíram a fé e a esperança, frutos maduros de espíritos nobres que já vislumbram a apoteose de um novo dia, de um novo amanhecer em sua vidas, seres iluminados que mesmo diante do sofrimento são capazes de enxergar além, ver por sobre os olhos da fé e da esperança os sinais da renovação, pois há sempre um bom sinal, há sempre um clarão de luz, há sempre uma mãos a ser estendida em meio aos escombros existenciais, nunca somos abandonados aos releu em sua plenitude, jamais.
Lamentações de Jeremias nos ensina essa verdade, nos ensina que o drama vivido por Israel em 586 a.C em Jerusalém, o drama de um povo que perdeu tudo, mas que soube na mais profunda experiência de miséria material e histórica, soube depositar sua esperança e sua fé em Deus, não como uma possibilidade, entretanto como uma certeza inabalável, a força necessária para continuar tendo esperança mesmo vivendo no contexto da desesperança, da dor e morte! Meus irmãos, judeus e palestinos, sejam vós ateus ou fieis, ponho meu coração, meu estado mental, meu espirito sobre vossa causa, sobre a paz!
Sobre todas as lembranças dolorosas, amargas e humilhantes, sobressai a lembrança de que YHWH é Deus e Senhor de toda vida e é soberano em amor, para vós outros irmãos muçulmano digo Allah, soberano Deus da mesma forma meus irmãos! Em amor e graça. O Amor se faz presente pelos olhos impessoal e sempre imanente e tangente do divino, por isso amabilíssimos irmãos e irmãs palestinos e judeus: Trago-vos á vossa memória aquilo que nos dá esperança.
1. Por que trazer à memória o que nos proporciona Esperança?
Porque conforme os versos 16 á 20 a falta de esperança causa a morte da alma.
16 Fez-me quebrar com pedrinhas de areia os meus dentes, cobriu-me de cinza.17 Afastou a paz de minha alma; esqueci-me do bem.18 Então, disse eu: já pereceu a minha glória, como também a minha esperança no SENHOR. 19 Lembra-te da minha aflição e do meu pranto, do absinto e do veneno.20 Minha alma, continuamente, os recorda e se abate dentro de mim.
E assim evidenciasse o fato de que a desesperança é fruto de uma alma morta, almas esquecidas do bem, sem esperança de um amanhã florescido de luzes, mesmo diante das trevas promovidas pelas más ações humanas. Almas amargas só recordam das amarguras, continuamente só olham para o passado doloroso, só guardam em seus porões existências as dores, as humilhações, carregam os fados pesados, e assim acarretam aos seus dharmas e mais e mais pesos, mais e mais fardos, esquecendo-se do sábio conselho do bem-feitor, “escolham meu fardo que é leve e suave”. Almas amargas, e temerosas, espíritos retraídos olham apenas para o passado com o olhar de desesperança!
Quais têm sido as lembranças que vós tendes cultivado em vossos corações? Mesmo frente a essa calamidade de terror e morte, meus irmãos, é deveras que tal circunstância haverá de vos marcar terrivelmente, no entanto que bem vos acrescentará para vossa evolução espiritual e humana, guardar tamanho rancor nessa existência tão curta nessa jornada passageira pela qual passamos aqui?
2. Quais são as lembranças que temos guardado em nossas memórias?
Será que guardamos a calamidade presente do dia á dia conforme remete o v. 20, “Minha alma, continuamente, os recorda e se abate dentro de mim”. Ou como nos faz lembrar o Salmo 137:1-6 “Às margens dos rios da Babilônia, nós nos assentávamos e chorávamos, lembrando-nos de Sião. 2 Nos salgueiros que lá havia, pendurávamos as nossas harpas, 3 pois aqueles que nos levaram cativos nos pediam canções, e os nossos opressores, que fôssemos alegres, dizendo: Entoai-nos algum dos cânticos de Sião.4 Como, porém, haveríamos de entoar o canto do SENHOR em terra estranha? 5 Se eu de ti me esquecer, ó Jerusalém, que se resseque a minha mão direita.6 Apegue-se-me a língua ao paladar, se me não lembrar de ti, se não preferir eu Jerusalém à minha maior alegria”.
Por muito tempo as lamentações fizeram parte das lembranças, como até os dias de hoje fazem parte dos ritos religiosos judaicos, pois lembrar faz parte do processo histórico, a história marca-nos com estilete de aço nossa alma, registrando nela suas profundas marcas e assim registrando nela sua história, entretanto cabe á nós escolhermos, continuar a reler o que nela está escrita ou retomar o curso de nossa história e reescrever nossa história.
3. Como estamos construindo a nossa história existencial? Com quais lembranças?
Aludimos ao Salmo 124:1 Cântico de romagem. De Davi Não fosse o SENHOR, que esteve ao nosso lado, Israel que o diga; 2 não fosse o SENHOR, que esteve ao nosso lado, quando os homens se levantaram contra nós,3 e nos teriam engolido vivos, quando a sua ira se acendeu contra nós; 4 as águas nos teriam submergido, e sobre a nossa alma teria passado a torrente;5 águas impetuosas teriam passado sobre a nossa alma. 6 Bendito o SENHOR, que não nos deu por presa aos dentes deles. 7 Salvou-se a nossa alma, como um pássaro do laço dos passarinheiros; quebrou-se o laço, e nós nos vimos livres.8 O nosso socorro está em o nome do SENHOR, criador do céu e da terra.
Será que estamos construindo nossa história pessoal e coletiva com lembranças de desesperança ou de esperança?
Da mesma sorte meditamos na alusão á outra lembrança salutar ao Salmo 125 Cântico de romagem Os que confiam no SENHOR são como o monte Sião, que não se abala, firme para sempre. 2 Como em redor de Jerusalém estão os montes, assim o SENHOR, em derredor do seu povo, desde agora e para sempre. 3 O cetro dos ímpios não permanecerá sobre a sorte dos justos, para que o justo não estenda a mão à iniquidade. 4 Faze o bem, SENHOR, aos bons e aos retos de coração.5 Quanto aos que se desviam para sendas tortuosas, levá-los-á o SENHOR juntamente com os malfeitores. Paz sobre Israel!
Ou construímos a nossa história com a mentalidade de quem reconhece e de quem vivencia em seu intimo, a plena certeza, apesar das adversidades da vida de que o Amor Eterno os impulsiona a superar qualquer crise, como nos faz lembrar Lamentações de Jeremias 3: 21 á 24
“21. Quero trazer à memória o que me pode dar esperança.22 As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim;23 renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade.24 A minha porção é o SENHOR, diz a minha alma; portanto, esperarei nele.”
Frente a esse chamado, meus amados irmãos e irmãs, tantos vós judeus e palestinos, tanto vós os que perderam de ambos os lados em grau maior ou menos seus entes queridos, de uma certa forma os dois lados durante décadas vivenciam as dores da intolerância, da radicalidade, da religiosidade cega e fundamentalista que já ceifaram milhares de vida em nome da ignorância mascarada pelo nome de Deus, vossa história, tem sido também a história de quem vós ama, a história de quem tem laços e sentimentos convosco, laços inquebrantáveis que vão além da carnalidade do sangue e da descendência patriarcal ou matriarcal, pois nossa ligação é espiritual somos irmãos do meus Pai –Mãe Bendito Seja o Vosso Santo e Misterioso Ser, desse que nos faz sermos Um que unidade na diversidade, amados, diante desde humilde pensamento que hoje ponho frente á vós qual será vossa postura?
Com as minhas sinceras e lacrimosas consolações por aquele que nos uni, o Bendito Pai, Em seu Pleno Amor, por seus mensageiros de luz, Yeshuah, se assim o for, Maomé se assim o for, Bahai 'U' Allah se assim o for, mas que a paz seja sobre vós e sobre Jerusalém, pois o Pai é um só, sobre isso não temos dúvida. Sobre este não há controvérsias e sobre Este Bendito Seja venhamos descansar!
Concluo meus irmãozinhos convidando-os á mergulhar no oceano límpido do perdão, perdoe um pouco mais hoje, do que você perdoou ontem, e manhã um pouco mais do que perdoou hoje e assim evolua na jornada perene do perdão imitando ao mestre dos mestre Yeshua ben Yosheph, o Jesus Nazareno. Paz e bem á todos vós!
Piscava sobre a tela de seu notebook o marcador do word, esperando á próxima palavra a ser digitada enquanto o velho padre apenas refletia sobre o que havia digitado, e relembrava cada palavra pela qual tinha verbalizado. Tinha a esperança de amenizar ou pelo menos solidarizar-se frente a angustia que tal e-mail significou para si.
Enviou o e-mail ao seu destinatário, ao seu amigo na Palestina, em seguida saiu calmamente pela por porta á fora, seguia á uma rua conhecida pelo nome Rua E, Bosque das Manqueiras, caminha em direção ao antigo Monte do Bom Jesus da Lapa, onde também ficava a famosa Pedra do Vaqueiro, refúgio meditativo onde costuma ir nas horas de reflexão, e quando queria avistar ao mesmo tempo o pôr do sol. E assim o fez, em silêncio via seu astro predileto repousar-se por sobre o manto alaranjado do imenso céu que cobria a cidade de Itaberaba, e repetia para si mesmo seu mantra solitário “Asher Arthorius Adonai Elohenu YHWH Ehad”. E assim ia o tempo passando.