“Um toque cor-de-rosa” – Cinema e Racismo

Nada melhor para despertar a minha curiosidade e necessidade de enriquecimento cultural, do que um filme que ilustrasse costumes que desconheço, descrevendo os preparativos para um casamento numa família muçulmana.

O enredo era construído sobre uma família de indianos muçulmanos, ismaelitas, radicados em Toronto. Imigrantes bem sucedidos, e portanto, abastados, satisfeitos porque tinham podido educar os filhos com estudos superiores.

Sobre o pano de fundo dos preparativos de um casamento, pode o espectador realizar quais as tradições a que deve submeter-se uma família que se preza, e sob o colorido e requintado vestuário feminino, e as frívolas preocupações expressas através das conversas das personagens femininas, avaliar da secundária condição da Mulher, e dos tabus sexuais a que deve submeter-se...

O cerne da história centra-se sobre a figura de uma mãe, viúva, que tem um filho radicado em Londres, e que para ele sonha com um casamento convencional. Tão longe da sua observação e controlo, não sabe que esse filho é homossexual e vive com o companheiro.

Sentindo-se solitária, resolve ir a Londres passar uns dias com o filho e regressar com ele a Toronto, para lhe apresentar a noiva que para ele projecta.

E aqui reside o segredo do filme.

Penso que é indiferente para a compreensão da história, o facto desta família viver no Canadá. É questão de pormenor. Porque o objectivo do filme é mostrar como é bom e refrescante viver como os Ocidentais, e deixar-se aculturar! Caso contrário a família retratada não passaria de um amontoado de retrógrados "monhés" (ipsis verbis), descontextualizados e inferiores: a tirada em que Gilles faz tal afirmação ao namorado é extremamente arrogante e resume o sentido do filme.

No final, em plena festa do casamento, Amid assume a sua homossexualidade na frente de todos os presentes, boquiabertos, e perante a passiva e discreta aceitação materna. Consequentemente, ele e o companheiro têm que abandonar a animada festa. E mãe, filho e genro vão para o apartamento dela, onde ela pode finalmente deixar também cair a máscara das conveniências e convidar o porteiro do prédio a subir, num clima de franco e feliz convívio, sem disfarces.

Poderei estar a exagerar... Mas suponho que não: A mãe deixa subir o porteiro... Para uma imigrante, proveniente de uma outra Cultura... a que mais poderia ela aspirar?... O Porteiro... estará bem para ela... Pouco importa que a família dela tenha enriquecido... Para a cultura "standart", todos eles serão sempre cidadãos "de segunda"...

É que segundo o argumento deste filme, a “cultura” só tem direitos de cidadania se for “à ocidental”, decalcando aquela conhecida frase atribuída a Jesus Cristo, “se não és por mim, és contra mim” (**). Isto é, à face da Terra só existe um modo de vida aceitável e saudável – e quem não o aceita não merece respeito nem reconhecimento.

Enfim, não foi filme que me deixasse satisfeita, mas foi sem dúvida mais um excelente exemplo de como sob a face inocente duma historieta sem relevo, se faz passar mensagens tão inscritas numa “guerra de culturas” que se prolonga há séculos e que só tem produzido guerra, sofrimento, e destruição.

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(*) – “UM TOQUE COR-DE-ROSA”

Argumento e Realização - Ian Iqbal Rashid; Reino Unido e Canadá; 2004

http://www.cineteka.com/index.php?op=Movie&id=001620

(**) – Citação atribuída a Jesus Cristo:

Marcos 9.40; Mateus 12.30; Lucas 11.23.

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A apresentação do filme, no endereço electrónico indicado, é "inocente", dando a pensar que se trata apenas de um filme bem humorado:

http://www.cineteka.com/index.php?op=Movie&id=001620

UMA COMÉDIA ROMÂNTICA CHEIA DE SURPRESAS!

"Uma Encantadora Comédia Romântica!" -Susannah Gora, Revista Première:

UM TOQUE COR-DE-ROSA é um choque de culturas, valores e sexualidade em tom de humor. Alim (Jimi Mistry, "Guru do Sexo") parece ter tudo: uma carreira, um namorado bonito e um guia pessoal que é o espírito de Cary Grant (Kyle MacLachlan, "Twin Peaks"). Para além disso, vive a milhares de quilómetros da sua mãe, Nuru (Suleka Mathew) e da sua conservadora família, o que permite manter em segredo o seu estilo de vida. Mas quando a mãe lhe faz uma visita surpresa, com a intenção de o arrastar para um casamento com uma "boa rapariga", o espírito de Cary Grant torna-se imprescindível.

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 30/07/2014
Reeditado em 25/07/2022
Código do texto: T4902878
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