Como seria o espaço do mosteiro do Santo Nome de Jesus da Ribeira Grande? I

Cruzando fontes de arquivo e de arqueologia com as do exame espacial e histórico aos mosteiros de clarissas da ilha – Esperança e Santo André, em Ponta Delgada e, Santo André, em Vila Franca -, vimos que há um padrão espacial para os mosteiros femininos franciscanos da ilha. Partindo deste pressuposto, propusemos em 2009 uma reconstituição plausível da sequência espacial dos edifícios do mosteiro do Santo Nome de Jesus da Ribeira Grande.

Reatando o jogo reconstitutivo de 2009, continuando a recorrer às mesmas fontes, em 2014, tentando entrar no mosteiro de Jesus, vemos que há igualmente um padrão comum de gosto: daí os azulejos, daí a temática dos azulejos, daí o local onde foram colocados. Daí, a nossa hipótese acerca dos locais presumíveis dos nossos azulejos: a igreja e os coros do mosteiro. Daí igualmente a hipótese de um mestre-de-obras comum ser também responsável pela disseminação de um gosto comum.

Antes de prosseguirmos neste trabalho, diga-se que este trabalho, iniciado na década de oitenta, visa às claras um objectivo final: saber como seria aquele mosteiro no tempo em que Madre Margarida Isabel do Apocalipse (autora do Arcano Místico) foi aí freira professa (1800-1832). Indo directo ao assunto, é continuar o museu do Arcano inaugurado em 2009.

Para nosso desgosto, como ficou antes claramente dito, verdade seja dita, por muito que tenhamos procurado, apenas encontrámos meras provas circunstanciais. Porque, é bom repeti-lo, os nossos fragmentos de azulejo têm origens obscuras: resultam de achados de superfície, de entulhos ou de contextos estratigráficos confusos.

Assim se compreende que: se a luz da arqueologia emite luz fraca, a do arquivo emite sombras; quase as da caverna de Platão. Admitindo que possa ter visto mal o que vi ou até que não tenha visto tudo o que havia a ver, admito que não foram encontradas quaisquer referências explícitas nos livros sobreviventes: nos conventuais, nos da alfândega ou nos notariais.

Obras no mosteiro? Vamos aos livros de receita e despesa. O Livro da Receita e Despesa, que vai de 1694 a 1735, para o ano de 1703, dá conta de despesas com o ‘embelezamento da capela (mor?).’ Mas de que embelezamentos se trata? Não diz. Pouco depois de 1703 ou já em 1710, fala-se de despesas de ‘cobertos’ para os altares da igreja, de cal para os consertos e para o ‘esteyrado’ que o padre confessor mandou vir . Para os anos de 1737 a 1738, sem se especificar o local onde se efectuaram as obras, os livros referem laconicamente ‘despesas com carpinteiros .’ Quais em concreto?

Confrontando a lacónica informação dos livros com o exame atento de vestígios no terreno, será plausível presumir-se que entre 1666 e 1727, o mosteiro tenha conhecido obras de vulto. Os lintéis das vergas das portas do ‘pomar’ e da ‘casa dos Confessores’ exibem números que poderão corresponder a datas: 1727 (?) e 1666. Datas que poderão corresponder ao ano final de campanhas de obras. Outro provável indício de obras, chega-nos através dos entulhos depositados junto a fundações. De quando serão? Talvez o colega Nicolau Wallenstein, especialista no vulcão do Fogo que fez um levantamento das cinzas vulcânicas das nossas fundações, possa dizer-nos se são anteriores ou posteriores ao vulcão do Fogo (1563). A partir daí, poder-se-á dizer algo mais seguro.

Tirando a arqueologia, o arquivo e a análise comparativa de espaços, dispomos ainda do contexto testemunhal. Que, apesar de se referir ao mosteiro de S. Francisco, mosteiro masculino, casa mãe da custódia franciscana de S. Miguel e de Santa Maria, Custódia da Puríssima Conceição da Província de São João Evangelista e Ilhas dos Açores, portanto, diferente das casas femininas, apesar de não referir directamente o mosteiro de Jesus, aponta, contudo, para um determinado padrão ou orientação comum aos mosteiros da ilha. O testemunho do americano John Webster, que viveu na ilha no início do século XIX, acende uma luz. Diz ele: ‘Todos os conventos em S. Miguel (…)’ obedecem ‘(…) ao mesmo plano do mosteiro de S. Francisco (…).’ O que não é correcto. Diz mais, referindo-se ainda à capela-mor de São Francisco: ‘O tecto (…) é de um magnifico entalho e todo dourado, sendo as paredes ornamentadas por uma espécie de mosaico, o qual examinado mais minuciosamente vemos consistir em azulejos de louça azul e branca, com cerca de seis polegadas quadradas cada um.’ O que é correcto.

Onde poderiam ter estado colocados os nossos? A resposta fica para o Perfil 24 B

Mário Moura

21 de Abril de 2014

Mário Moura
Enviado por Mário Moura em 21/04/2014
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