Quando Jessé virou anjo

Todo dia almoço no mesmo lugar, no centro de Campinas. É um lugar super gostoso e barato.

Ontem quando estava entrando, vi um homem sentado ao lado da porta, estava encolhido, parecia meio dormindo. Devia ter uns trinta e poucos anos e era preto. Perguntei se queria almoçar e ele meio cambaleante concordou.

Subimos juntos as escadas e disse que podia comer à vontade, o que quisesse. Também fiz o meu prato e indiquei uma mesa pra sentarmos juntos.

Ele começou a comer e começamos a conversar. Disse que se chamava Jessé, era pintor e predreiro, morava na rua. Tinha um tio em Sumaré que ofereceu uma possibilidade de trabalho, mas não tinha dinheiro pra passagem (R$ 3,20).

Era viúvo, com dois filhos adolescentes que moravam no Rio com tia, os quais não via há mais de um ano.

Se pudesse fazer o trabalho oferecido pelo tio, teria condições de rever os filhos no Rio. Disse que ele iria fazer o trabalho e lhe dei R$ 10,00. Ele começou a chorar.

Interrompi os seus tantos agradecimentos dizendo que a única coisa que gostaria que fizesse é que usasse o dinheiro pra ir à Sumaré e nada mais.

Tomamos juntos uma Coca, acabamos o nosso almoço, paguei nossas contas e descemos pra rua. Na hora de nos despedirmos nos abraçamos e os dois se emocionaram, deixando escapulir algumas lágrimas.

Disse que a minha atitude tinha sido única nos últimos tempos que não traduzia rejeição, discriminação, coisas assim, e que o tinha feito nascer de novo pra vida. E que eu era um anjo que veio lhe trazer o que mais precisava naquele momento.

Fiquei observando de longe o Jessé seguir o seu caminho. Ele andava feito um moleque, meio pulando, meio saltitando. Estava feliz da vida e confiante. Tomara Deus que tenha conseguido chegar à Sumaré e arranjado o emprego oferecido pelo tio que lhe permitiria rever seus filhos tão queridos e tão distantes.

Confesso que quem nasceu de novo naquele momento fui eu.

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Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 31/03/2011
Reeditado em 31/03/2011
Código do texto: T2881026
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