Sobre o Amor e Mais
SOBRE O AMOR
Todas as pessoas desejam ser felizes, então, por que há tanto sofrimento no mundo?
A inversão de valores que vem acontecendo no mundo em todas as sociedades, raças, credos, ideologias vem atropelando o verdadeiro crescimento humano. As ilusões, as ambições, o orgulho, a vaidade, a ganância, o materialismo têm criado os mais diversos conflitos geradores das frustrações, depressões, doenças diversas, violência, crueldade, crimes, enfim, a infelicidade.
As religiões e até as várias teorias humanísticas ensinam que devemos trabalhar em favor dos semelhantes. “Amar ao próximo como a si mesmo”. Entretanto as pessoas não amam a si mesmas, como podem amar o próximo?
Ainda estamos muito longe do amor verdadeiro. O que se vê todo o tempo é a prática do bem por obrigação, pelo medo de ir para o inferno, é o desejo de ganhar pontos diante da sociedade e até uma tentativa de barganha com Deus. Como alguém pode dar ao outro o que não tem por si? Como alguém pode ser bom sem sentir amor?
Em psicanálise diz-se que “amar o outro é dar o que não se tem”. Digo eu que amar o outro é ser o que não se é...
As pessoas vivem pregando o amor ao próximo, mas entregam-se à mesquinhez, à desonestidade, a maledicência, a fofoca, a calúnia, a ironia, ao desprezo pelo que é diferente, ao julgamento da conduta do outro. E, portanto suas almas estão vazias, abandonadas, sem conforto, sem alegria, sem carinho, sem amor.
Por toda parte vê-se o descaso com tudo que é de interesse público – culpa-se o governo. Mas este é um problema de cada um. O que acontece na sociedade é reflexo do que vai dentro do coração das pessoas. Intelectualmente todos pregam o bem e as boas ações, mas raros os praticam. O que é da comunidade não é de ninguém. Pode ser destruído. Essa é a maior chaga da humanidade.
O amor pressupõe o capricho, o zelo, o trabalho bem feito, o prazer de cooperar, o respeito pelo bem comum, o respeito a si mesmo, o cuidar de si, o compreender-se e aceitar-se. Pressupõe o gostar da própria companhia, o empenho da vontade de ser melhor, o disciplinar a própria conduta, o pensar positivamente sobre as coisas da vida, a alegria e a gratitude de viver, o cuidado com seu ambiente, seu planeta, sua comunidade próxima, o pensar, ouvir, falar e fazer com caridade.
Nossa sociedade está doente e infeliz, mas não é difícil consertar isto. Nada é difícil quando a vida quer. E a vida trabalha o tempo todo para isso fazendo com que cada pessoa colha os resultados de suas atitudes. Se a violência e a crueldade refletem a falta de amor dos corações, a dor, as tragédias, as doenças são os meios que a vida utiliza para sensibilizar, abrir os corações e as consciências para mostrar os verdadeiros valores. “Só se cresce através do sofrimento”? Então um dia todos iremos crescer.
Enquanto a humanidade se entregar ao racionalismo e as emoções ao invés de cultivar seus sentimentos estará sofrendo, empobrecendo-se espiritualmente, pois o racionalismo reprime o sentimento e as emoções são reações do pensamento, refletem ambos a maneira com que se vê e julga determinados fatos. Os sentimentos vêm da alma, aparecem e extravasam simplesmente. Eles refletem – se no cultivo do belo, no capricho de fazer coisas, no carinho e na ternura por si, por tudo e por todos. É o prazer exteriorizado. Quando se ama o amor se expressa livremente, esse sentimento, seu carisma, envolve tudo que se toca e o prazer, a alegria que se sente faz a felicidade.
Mais Sobre o Amor
Em minha monografia “A Religiosidade do Homem face aos diversos saberes” faço um paralelo entre o que Roman Roland chamou de “sentimento oceânico”, Freud designou de “arquivos acásicos” e Jung de “inconsciente coletivo”. As religiões o chamam caridade num sentido mais moral que sentimental, Jung denominou-o “numinosum”... Hoje percebo que todos falavam de Amor.
O Amor, como todas as características imanentes ao humano, é passível de evolução tanto coletiva como individual de acordo com o percurso da humanidade e do indivíduo em si. Tornou-se uma palavra banalizada, expressão de paixões e ilusões decorrentes da estagnação e da confusão do homem encarnado neste planeta de aprendizado e expiação.
Todos o desejam como fonte de felicidade, mas ninguém sabe exatamente o que vem a ser o Amor, confundindo-o com posse, dominação, ascendência, subjugação, fraqueza, e até subserviência. Outros o consideram algo que deve vir do outro como salvação de suas vidas sofridas, insípidas ou tediosas e que garantirá uma felicidade futura ou, em sua falta, a frustração insolúvel.
Há muitos anos atrás (eu era uma adolescente cheia de sonhos) enquanto eu discorria sobre o amor, alguém me disse:
_ Bobagem, menina, amor a gente não define, amor a gente sente e pronto...
Acredito que o meu amigo não estava tão certo assim...
È claro que definir o sentimento de amor é limitá-lo a conceitos, mas podemos, por outro lado, definir o que não é amor, então TUDO que não for amor, é amor.
Já que não amamos o que não conhecemos e que primordialmente nem nos conhecemos, é necessário que, em primeira instância nos conheçamos e isto demanda tempo e foco, porque estamos sempre voltados a conhecer o outro...
“Conhece-te a ti mesmo” é uma afirmação socrática perene e universal.
Decorrente desta primeira instância vêm as seguintes:
1ª) Amar não é sentir ciúme. O ciúme é basicamente uma expressão de posse, de propriedade: Fulano(a) é meu (minha). Como meus são a minha casa, o meu carro, a minha geladeira, o meu som. “Ninguém é de ninguém”. Somos seres livres amparados pelo livre arbítrio em que nossas escolhas não podem ser cerceadas nem determinadas pela vontade ou pelo desejo do outro ou por suas inseguranças. Quando sinto ciúme além do senso de posse demonstro também uma insegurança baseada na baixa estima que vem a significar – não sou digno do amor do outro – ele /ela é melhor que eu, então outro (a) pode conquistar seu amor.
2ª) Amar não é matar o outro. Não existe essa de matar por amor. Amor e ódio são sentimentos opositores e quando a psicologia diz que eles andam juntos está se referindo a este arremedo de amor ilusório em que um tem o poder sobre os sentimentos ou a conduta do outro. O amor não aprisiona, liberta, pois só o ser livre em seus sentimentos e essência pode fazer opções de ir, voltar, ficar ou partir sem subjugações ou peias de qualquer espécie.
3ª) Amar não pressupõe abrir mão de si mesmo em favor do outro. Isto é anulação e vai dar, cedo ou tarde, em frustração, depressão, separação ou renunciação à vida.
4ª) Amar não é esperar que o outro (a) lhe faça feliz ou que você faça o outro(a) feliz, mas é ambos compartilharem a felicidade que cada uma já construiu em si.
5ª) Amar não é algo retumbante e grandioso como uma queima de fogos no Ano Novo, mas é construção do dia-a-dia nas coisas mais simples e corriqueiras. É enfrentar juntos os desafios, os problemas, as necessidades sem queixas nem rancores como contingências da vida , é principalmente não culpar os outros por nossos fracassos e dores, mas sabermo-nos responsáveis por cada trilha percorrida sós ou acompanhados.
6ª) Amar não é invejar as vitórias, os sucessos do outro. Não é ocupar-se das falhas do outro, mas é verificar-se a si mesmo para perceber em que desvio nossa vida nos está levando para que não obtenhamos aquilo de que nos consideramos merecedores.
O amor e o conhecimento são imensos conteúdos e, portanto, só podem “caber” em imensos continentes. Assim é que como o homem não domina todo o conhecimento também não pode conhecer o Amor por ser pequeno, frágil e inconseqüente e acomodado...
Helena de Santa Rosa
Niterói, 02 de outubro de 2010
12:06