Derme e Psique
Olho para o dorso das mãos e percebo: a derme mudou. Mudou o aspecto, a textura, a cor, até o cheiro é diferente. O frio faz com que elas pareçam mais enrrugadas e o silêncio da noite me faz perceber, neste olhar, que os anos passaram.
Foram poucas as vezes que parei para o obervar estes intrumentos mais imediatos que me fazem encostar, pegar, prender e segurar a infinidade de desejos oferecidos pela matéria.
Foram poucas as vezes que aproximei-as do nariz para sentir o seu cheiro, que de tão familiar, chamo de cheiro de “nada”.
Foram poucas as vezes que notei que elas mudaram, mudam e continuarão mudando, até o dia em que com os dedos entrelaçados, se consumir juntamente com todo o corpo físico, pela decomposição e depois pela absorção de Gaia.
Neste processo de envelhecimento não consigo ver a psique, não sinto seu cheiro, não sei se ela muda e para onde vai. Acho que as vezes ela não quer mudar, quer permanecer criança, quer fazer travessuras e se sentir protegida, pensar que tudo é bom e que não é preciso se preocupar.
Penso que ela quer permanecer acreditando no impossível, em super-heróis e na bondade de todos os homens. Penso que ela insiste em acreditar na doação, no prazer em fazer o que é prazeroso sem culpa.
Penso que ela não sabe que a derme muda, troca a textura, a cor, o cheiro, se enche de rugas, se decompõe e se transforma em Gaia.
Ao olhar para o dorso das minhas mãos é como se eu pudesse mostrar para psique a real realidade. É como se eu a decepcionasse, é como se eu tivesse a obrigação de fazer com que ela percebesse que a vida é real.