Da irreversibilidade da poesia

Há sobretudo um poema de Ferreira Gullar que em seis versos alcança muito mais do que eu ou qualquer outro poderia num longo ensaio. Essa é pois uma das características que eu mais admiro na poesia, seu caráter de síntese; síntese em termos de brevidade e resumo, mas também no outro sentido de apoiada quase numa dialética hegeliana: o autor, o leitor e o poema.

Embora a poesia seja uma manifestação artística, sua diferenciação das demais artes e consequente singularidade é justo por esse flerte com a razão, fuga da estética pura, especialmente na poesia contemporânea. Assim, por mais convincente e sedutora que seja a ideia do poema, há sempre em que lê uma disposição de sufocar a poética proposta, pois essa é a dinâmica da construção de pensamento — tese, antítese e síntese.

Filosofia à parte, fato é que o poeta não pode rejeitar sua condição, ou, that is the question, pode? É o que pergunta Gullar.

That is the question

Dois e dois são quatro.

Nasci cresci

para me converter em retrato?

em fonema? em morfema?

Aceito

ou detono o poema?