Analogias

Há alguns anos, em visita a parentes, vi uma arara em cativeiro. Tive a nítida sensação que os olhos do pássaro expressavam muita dor por não dispor de um igual para partilhar a existência. Ao questionar a dona do pássaro porque não se formava um casal, coloquei a argumentação de que tal procedimento tornaria a vida do pássaro muito mais rica, e que nós, os humanos, agíamos de modo extremamente cruel, tirando do convívio de seus iguais um ente apenas para nosso deleite. Na época eu era pouco mais que um adolescente, lá pela casa dos vinte anos, quando ainda não havia toda essa grita (maravilhosa grita, por sinal) em defesa dos animais, nossos irmãos desprotegidos na aventura do existir. Quando bem mais tarde vi um mico leão dourado na casa de um amigo, voltou-me a mesma sensação que vi nos olhos daquela arara de minha juventude; a mesma solidão expressa nos olhos tristes e nos movimentos lassos. A analogia do título, e que me motivou a sentar neste PC, é colocar em palavras escritas um sentimento dificílimo de expressar, pois é muito mais sentir: Saudade. Ela chega sorrateira nas asas de uma música, no cheiro de um perfume, no contemplar extasiado de uma paisagem, ou mesmo de uma cena de filme. Onde houver uma brecha, por ela penetra a Saudade em nossa alma, apossando-se inteira, com modos de rainha absolutista, de todo o nosso ser. Não há bastião que se possa interpor ao assalto de força tão devastadora. Sendo inútil a resistência, torna-se melhor render-se incondicionalmente, aceitando os termos impostos, entre os quais o reviver momentos de amor que nos deram sensações só concedidas aos deuses. Momentos estes que alimentam a Saudade, sentimento dolorido, mas que nos dá a certeza de que vale muito a pena viver um amor, pois sem as dores geradas pela Saudade de um amor vivido intensamente, a vida seria como um deserto sem Oásis para lhe quebrar a monotonia de suas escaldantes areias.

São José dos Campos, 10/07/2008.

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 07/11/2009
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