A Imensa Tela


Hoje,
nessa manhã em que tudo parece morno
imaginando
como seria breve o meu repouso
desejei que a vida e todas as coisas que fazem parte da vida
dessem uma pausa.
Paralisassem como imagens congeladas numa tela de tv
e eu e somente eu pudesse me locomover
queria ver o mundo sem o seu movimento louco frenético
queria ver os rostos estáticos, patéticos, das pessoas paralisadas
queria ver o cão de boca aberta e depois calar o grito do cão dentro da minha mente
queria ver os automóveis parados, estacionados no meio das avenidas sem um motivo mecânico ou humano alienado que os movessem
queria ver a rosa num jardim paralisado ver a rosa como numa tela, pintada, para ser observada, imaginada e desejada, mas, jamais cheirada
queria ver as crianças tomando sorvetes, lambuzadas, desfiguradas, criando diversas criaturas como imagens abstratas
queria ver o fogo congelado, o fogo em estado sólido como uma pedra fria e depois dançar em sua volta feito um índio hipócrita
queria ver o sexo sem movimento, ele dentro dela, ela de pernas abertas, como dois bonecos infláveis
queria ver as pessoas nas janelas como num quadro, nos bares como cartazes, nas praças como estatuas, nas ruas como placas de sinalização e nas fabricas como ferramentas
e depois queria olhar tudo de longe, de muito longe, do alto de uma montanha cercado de infinitas pedras onde a repetição é quase tudo
olhar o mundo como um grande e infinito deserto
olhar o mundo mais longe ainda, olhar o mundo por dentro da própria casca
ver o mundo de dentro para fora como um feto, como alguém que não esta só
que nunca esteve só, que desde o inicio esteve junto de si
e que apaixonadamente aceita fazer parte dessa imensa tela.