O caminho do indigno
É o fim de um dia.
Dos temores mais recônditos de uma alma cansada e costurada, esse é o maior. O maior, enormemente crescente a cada dia que se vê realmente, completamente, loucamente... sozinho.
Dos mais desencontrados sentimentos são encontrados. Encontrados nos desencontros do coração certo de uma coisa e incerto de uma vida. Toda a parafernália emocional que foi amontoada durante os últimos meses de mentiras, desconfianças, desrespeitos, mudanças, assimilação de um e enlouquecimento do outro.
Sim, um assimilou e amadureceu. Outro não se resignou, e enlouqueceu.
Ó estrada maravilhosa de terra fofa e solta, de árvores verdes e frondosas, margaridas limpas, gatos cheirosos, cães rebolantes, caminhadas, ninhos, chazinhos, amiguinhos, companheirismo... ó estrada irreal que me deste a idéia de que a vida era o que não era. Ó estrada irreal, ó casa irreal, ó casamento irreal... ó companheira irreal, que mudaste, que se resignaste, que talvez cresceste, e me olhaste de cima para baixo... ainda que não foi tua intenção.
Mentira, porque foi tudo real, cada momento, cada situação.
Mas foi tudo verdadeiramente passado.
O presente, o hoje, é o mês de abril, é quando não me encontro mais. É quando sinto-te, insanidade sutil, fria, gelatinosa, a adentrar meu cérebro desprotegido. Esse ainda é o hoje, ainda me prendo a este dia, apesar de já ser janeiro do ano seguinte! E tanto fiz, tanto fizeram, tanto tentaram, tanto tentei, tanto chorei e sorri, mais chorei que sorri, mais senti que emocionei, mais descobri que há o lado negro de todo anjo. O teu anjo, teu presente, teu pedacinho separado, este a quem "tentou ajudar, julgou ser apenas o amor o bastante", este mesmo a quem disseste que a estrada agora era dele, e só dele.
Tudo acontece hoje. Não há mais que um dia, não há mais que vinte e quatro horas, não mais que alguns minutos para que eu perceba que o lado negro deita sobre meu pescoço, nem mais se disfarça. Não se enxerga mais luz alguma que resplandeça dessa mente de hoje. Não há mais que um dia para que me apareça nos ouvidos tapados de lama a palavra "INDIGNO".
E o indigno ser de hoje, que não soube ter fé, nem perdoar, nem entender, nem compreender que talvez isso seja apenas o seu destino, diz hoje: o dia acabou.
O indigno Vahara diz que a palavra indigno se explica unicamente pela falta de fé. Ele não tem fé. E sempre teve o que foi necessário para tê-la mas, parafraseando um dos mortos aos 27 anos: "eu nunca falho em falhar". Essa mesma frase que ouviste há cinco anos e oito meses para fazer-te desistir. Mas não o fizeste. E teve a chance de caminhar naquela linda estrada. E agora? Que me dizes, indigno Vahara?
E o dia acaba. Agora se acaba o dia intenso. Tão intenso quanto Vahara desejou, tão longo quanto vós o fizestes, ela deu fim a ele muito antes, porque é mais digna, tem mais fé, só não teve fé no que tu, indigno, quis que ela tivesse.
O dia acaba. A luz se apaga.
Ela se mantém única. Não perfeita, mas única.
O que será do amanhã?
O que será do amanhã dela, ela que vinha vestida de branco e reluzente, e sai como uma foto 3x4 em tua carteira?
O que será do teu amanhã, indigno Vahara? O que será dessa tua dor, que guardaste para deixar escorrer agora? O que será desse teu coração, da tua mente, da tua insanidade (que pode atravessar a noite contigo!).
Só algo a dizer tenho a ti, indigno: vai-te daqui...
E aqui termina a tua caminhada de um dia...