André Anlub e Rogério Camargo 135
Os olhares se cruzam bruscamente nessa tarde de verão; o sorvete vai ao chão e nesse exato momento cai uma tempestade de granizo.
A bonança vira Bonanza em momento de tiroteio, bandidos atacando Panderosa, os Cartwrigh defendendo sua casa com denodo.
O sonho torna-se real, a TV torna-se real; agora tem material para continuar o seu livro; agora achou quem procurava para protagonizar sua história.
Senta-se diante da memória e recompõe-se depois de um pequeno desequilíbrio. Imagina-se imaginando e é o suficiente.
O cheiro do chá quente se espalha ao som da máquina de escrever enquanto a brisa balança as cortinas finas que parecem dançarinas de balé.
Na fumaça azulada escrevem-se nomes e datas. Altera todas. Mistura todas. E sorri como um garoto na confeitaria.
Derrama no papel o que não viveu e sabe que nunca viverá. Cria aquele casal completo, de mentes idênticas – de hábitos isentos, que ficariam juntos até além-morte.
Cria o detetive, o mistério, a solução do mistério. Cria o romance político e depois se pergunta: Por que criei o romance político?
Nesse exato momento, atrás dele, a porta é aberta por um sujeito estranho. Os olhares se cruzam e um grito é ouvido.
Estou dentro de meu livro? O meu livro abriu portas em vez de páginas e eu entrei por elas? Bem, isso fica para depois. Agora é este sujeito aqui.
O real torna-se sonho e seu livro torna-se sonho porque sempre viveu sua vida projetando uma possível realidade. Uma realidade paralela.
Paralelo ao sujeito que é ele e não é ele, senta e estende a mão. O de lá também estende. Toca e sente. Toca e não sente. Sente e não toca. E põe-se a rir como quem entendeu, afinal, o que escreve.
Rogério Camargo André Anlub
(28/4/15)