Reclamando (meio bêbado) de Macunaíma
Me deixa falar sobre a última das minhas leituras.
Esse texto é uma breve revisão e resumo e indicação e crítica e análise e resenha e toda essa sorte de textos em que o autor faz considerações sobre algum outro texto; mas como eu não sou técnico de nada e nem sei escrever toda essa sorte de textos, é só consideração mesmo.
Faz de conta que sou seu amigo; falando sem parar e sem muita coesão sobre o último livro que leu. Me dê, inclusive, a licença da loucura de algumas taças de vinho. E perceba que, afinal, eu falei mais da minha experiência com o livro, e com o universo de estudos que o rodeia, do que do próprio livro...
De primeira eu fiquei bem decepcionado com o livro; esperava uma imersão mais profunda no universo indígena, queria panteões e cantos e contos e batalhas e receitas e técnicas e geografia e botânica e todas as sabedorias indígenas datadas de antes de 1500. E eu queria tudo isso entregue de mão beijada, de preferência sem palavras difíceis e sem enrolação pois tenho muita e muita preguiça. E o que eu ganhei? Lendas indígenas surrupiadas do livro de um alemão e adulteradas para tornar o Makunaíma, herói indígena criador do homem, no Macunaíma do Mário de Andrade. E foi a Lucia de Sá quem me contou isso.
A leitura paralela dos textos Macunaíma e Literaturas da floresta (da Lucia de Sá) foi fundamental para mudar a minha opinião acerca do primeiro. Macunaíma não se propõe a ser um manual de pajelança; os rituais e fórmulas mágicas estão no texto sim, mas são melhor explicados pela Lucia. Os cânticos também estão espalhados por aqui e por ali, assim com algumas sabedorias indígenas e coisas muito interessantes acerca desse universo. O que a mão do Mário fez foi tornar tudo isso num largo conto misturando os dois mundos, o do Makunaíma e o do próprio Mário, criando assim o Macunaíma. Visto por esse ângulo eu gostei muito do livro! E ainda tenho de terminar o Literaturas da floresta;
Depois de ler o livro fui ver o filme (datado 1900 e 69) dirigido pelo safado do Joaquim Pedro de Andrade; sim, um grande de um safado. O ordinário, com todo respeito ao finado, adicionou peito e bunda em cada vírgula do texto. Chegou ao ponto de uma cena em que Ci (a mãe do mato no livro e, no filme, a mãe da cidade) esquentava a mamadeira de seu filho enquanto entregava aos espectadores um belissímo topless, de graça assim. Pois bem, aos héteros e lésbicas, recomendo, aos demais, é um bom filme apesar desses exageros desnecessários. Joaquim aplica na obra algumas modificações, assim como Mário fez com a lenda original, então é tudo muito interessante de se ver.
Afinal eu gostei de ‘Macunaíma’, do Mário de Andrade, estou gostando mais ainda de ‘Literaturas da floresta’, da Lucia de Sá, e pretendo ler o ‘original’ (que nem é original, pois as lendas são originalmente dos índios) do tal alemão Theodor Koch-Grünberg chamado ‘De Roraima ao Orinoco’. Gostei da forma como o Mário escreve algumas passagens, quase sem parar para respirar, é bem... surrealista?