"Genocídio consentido"

O negro carrega uma dor ancestral, visceral, antiga.

O branco carrega a ancestral vergonha da crueldade, o ato imundo de tirar a vida do negro por nada.

O brasileiro de hoje é herança mútua viva, de quem matou e de quem sentiu a dor, duas vertentes entrelaçadas em nosso peito.

Eu, branca ou parda, ou amarela, que pouco importa, carrego a vergonha ríspida em saber que meus ancestrais brancos mataram os meus ancestrais negros e carrego uma parcela da dor dos meus ancestrais negros que perderam suas vidas e as de quem amavam, apenas por existir nesse mundo, por existir!

Saber que essa visão e ato abominável ainda se perpetuam, sobretudo em um momento tão caótico, em que os dados dos mortos por COVID constam em torno de 1170 no dia de hoje, aqui em nosso país, é um verdadeiro tapa na cara, tapa na alma. Estamos vivendo um "genocídio consentido" e isso traz uma enxurrada de angústia, frustração, impotência, além da dor e da vergonha, que desabam simultaneamente sobre nossas cabeças.

O Brasil inteiro deveria chorar, somos esse povo, que mata por nada, perde a vida por nada e que é indiferente a muitos.