Devaneios de uma mente inquieta
Tentava entender o que era esse acumulado de pequenas memórias. Muitas faziam mais mal do que bem, porque doíam, mas doíam mesmo, do tipo de causar dores no estômago, sufoco na respiração e palpitações no coração. E navegava nesse mar de lembranças. Entre o que aconteceu e como as coisas poderiam ter acontecido caso as intervenções dialogais tivessem sido outras. Como pode o passado interferir tanto assim? Principalmente o passado numa construção que não ocorreu, mas a possibilidade de uma intervenção que talvez o eu da vez não tivesse estruturas para tomar, sejam elas materiais, físicas, mentais ou espirituais. Que excesso é esse? Essa intensidade de autocobrança, de perfeccionismo, de autoavaliação chegam num nível narcisista ou egoísta, num eu que transita entre ele demais ou os outros demais, em dois pólos bastante antagônicos, pois por vezes abre mão de si para dar espaço aos outros, mas pensando em si, pelo medo da rejeição, ou da crítica negativa. O processo reflexivo é doloroso. A tomada de ações é uma faca de dois gumes. A realidade é traiçoeira, uma vez que o que se planeja, nas suas várias possibilidades, pouco se constitui na efetividade, pois o momento traz suas reações, tensões e possibilidades que não tinham sido pensadas. Depois tudo isso passa por um filtro, várias e várias vezes. E nesse filtro a busca é pela perfeição, do dito, do não dito. Do que poderia ter sido para alcançar a distinção, a admiração de outros. Penso agora, após tantos escritos, qual o espaço para a satisfação pessoal, ou mesmo um orgulho de si, que perpassa o cuidado. Qual o espaço para o cuidado? Principalmente o cuidado direcionado para o Eu de agora. Esse que é resultado de todo esse processo passado, mas que é cobrado viver o agora, tomar decisões que impactarão um eu futuro, trazendo para o eu de agora uma responsabilidade tamanha. Ele é responsável por uma vida futura e a dele, e além de tudo de ainda organizar o pensamento de um eu passado que é o dele. É um ciclo temporal de responsabilidades que dão a ideia de uma prisão. É como se estivesse numa roleta que gira para diferentes lados ao mesmo tempo, ultrapassando as leis da inteligibilidade da física. Quantos "eu" habitam esse corpo? Essa mente? Tudinho fica confuso. Qual o espaço para o prazer, nas suas mais variadas materialidades? O que fazer e como fazer?