Discurso de posse de Ronan Matos na Academia Juvenil Acreana de Letras

Está disposto a seguir de maneira integral o meu ''Discurso de Posse'' na Academia Juvenil Acreana de Letras. A solenidade ocorreu em setembro de 2018.

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Um escritor que tem vergonha ou receio do que o leitor vai pensar dele a respeito do que escreveu, em minha opinião, é alguém que ainda não está maduro para escrever [...] Acredito muito nas palavras de Rainer Maria Rilke em seu maravilhoso livro “Cartas a um Jovem Poeta”: alguém só deve se meter a escrever se sentir que não seria capaz de viver se não escrevesse [...] Não foi como um hobby ou uma distração nos momentos de ócio que comecei a escrever. Escrever é para mim uma questão de sobrevivência, no sentido existencial.

Por mais que eu tente passar para o papel os devaneios de um jovem, ainda não me considero um escritor. Sou acima de tudo um grande leitor, que se perde entre dois mundos - o da Ficção e o da Realidade. “Porque quanto mais lemos, mais rapidamente somos capazes de executar o truque mágico de ver como as letras foram combinadas em palavras dotadas de sentido”.

Talvez o dizer que possa resumir de certa forma o que é a literatura na minha vida tanto em relação à leitura quanto no que diz respeito à escrita seria a frase do Ilustre filósofo e escritor Britânico Tolkien, conhecido internacionalmente pelas suas obras consagradas como "'O Hobbit'' e o ''Senhor dos Anéis'':

"Não se adquire um bom vocabulário com a leitura de livros escritos conforme uma idéia do que seja o vocabulário da faixa etária do leitor. Ele vem da leitura de livros acima da sua capacidade".

Não sei se sou escritor, mas sou um jovem propenso às letras, que ainda não encontrou êxtase maior do que aquele em que se encontra quando ablutado nelas. As letras não são uma escolha, mas uma vocação. Do latim vocare, é um chamamento do que transcende. Uma exigência indesviável somente mediante a qual se poderá nortear a vida, dando-lhe sentido, como bem pontua a psicologia frankliana. Apesar do que aponta o Prof. Olavo de Carvalho, no sentido de que a "realização superior do homem" vem sendo substituída pela mera busca de emprego, decidi, como ato de suprema vontade, ir contra a corrente, marchar contra o ímpeto das massas. Atender a um excelso chamado.

Toda literatura é moral. Duma forma ou doutra, em verso ou em prosa, temos a ambiciosa pretensão de transpor nossa visão de mundo, nossa particularíssima - ainda que nosso ego nos diga que é universal - perspectiva do homem e do universo. Nesse sentido, toda a filosofia, entendida como compreensão de mundo, como uma atividade permanente do espírito humano, tem por fim prático a moralização, a correção e o apontamento da conduta humana. Há os que discordariam de minhas ponderações, entrementes, até os antimoralistas prescrevem suas perspectivas éticas sobre o homem independentemente do quão degeneradas possam ser consideradas. A literatura moral não morreu com Ariano Suassuna, mas vive em cadaletra e cada verso que a terra expele.

Minha perspectiva de mundo, confesso, já se encontra em meus versos. Sou um espiritualista; para mim, o mundo não se reduz à sua existência material imediata. Pelo contrário, transborda de tal, como o Real não pode ser totalmente apreendido, processado ou exprimido pelos nossos limitados circuitos neurais. Não me vejo como um indivíduo, minha existência é naturalmente referenciada no outro. A sociedade, para a sociologia de Luhmann, é um sistema de comunicação omniabarcador. E a comunicação, que produz a dimensão social, reside na relação entre Ego e Alter. Assim, jamais poderei pensar em mim, senão através do outro.

Creio na integração de Deus, da Pátria e da Família. Estes só podem ser exprimidos sem erro, nos limites da simples razão, quando estão unidos. E nisso se insere minha presença nesta ilustre academia juvenil. Trilhar os passos dos que já foram e abrir os caminhos aos que virão, inserindo-me num harmônico movimento interior da História, que visa romper as amarras castrantes do materialismo. Assim como Gustavo Barroso, compreendo minha vida na missão de defender e eternizar o nosso povo. Se Barroso eternizou o homem cearense, eis que ambiciono inscrever na literatura universal cada traço dos povos acreanos em suas similitudes e distinções. O poeta, assim como outrora Plínio Salgado e Menotti Del Picchia no Movimento do Verde-Amarelismo, deve ser vanguarda para a sua gente, para o seu povo. E jamais separar o político do poético. E a estética da ética e da retórica. Os muros da academia não são um fim em si e nem devem cerrar limites ou traços fronteiriços com a realidade e o povo. Da Academia, virá a arte. E da arte, virá a Academia. A arte, por sua vez, provém da legítima expressão do povo, de seus anseios, de suas crenças e de sua formação existencial. A arqueologia de uma gente é antes de tudo uma atividade literária.

Por isso, não poderia neste tão importante momento de minha vida esquecer de mencionar e prestar homenagens àqueles que são os responsáveis por estar aqui nesse momento: primeiramente aos meus Pais, amigos e parentes, que desde cedo me incentivaram no mundo da leitura e da literatura; em seguida, aos grandes vultos históricos de nossa Nação, em que me inspiro e que são também os responsáveis pela minha formação intelectual, política e doutrinária: Oliveira Vianna, Farias Brito, Plínio Salgado, Gustavo Barroso, Miguel Reale, José Guiomard dos Santos, Américo Jacobina Lacombe e agora o ilustre Nelson Rodrigues, patrono da cadeira de n°19 desta Casa, que agora passo a ocupar, e, por fim, mas não menos importante,antes pelo contrário, agradeço ao''Criador inefável que é a fonte verdadeira da luz e da ciência,que derramou sobre as trevas da minha inteligência um raio da tua claridade.Que me deu inteligência para compreender,memória para reter,facilidade para aprender, subtileza para interpretar,e graça abundante para falar''.

Gostaria neste momento de citar o magno poema do amigo poeta e jurista Victor Emanuel Vilela Barbuy, que foi escrito com grande maestria em fevereiro de 2016 no bairro, antiga cidade, de Santo Amaro, em São Paulo...

A POESIA

A Poesia é ponte

Sobre o rio de névoa

Que separa

A floresta da realidade

Do castelo encantado do sonho.

E o poeta, nem alegre nem triste,

É não somente um fingidor,

Que, como diria Pessoa,

'Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente',

Mas também um sonhador,

E sonha tão completamente

Que chega a pensar que é sonho

O sonho que deveras sonha

Ou mesmo a realidade que o cerca.

Ah! como eu queria ser poeta,

Não para portar à cabeça

Uma coroa de louros,

Mas para entrar novamente,

Como nos tempos de menino,

No castelo encantado do sonho,

E, como naqueles dias já distantes,

Navegar,

Numa gôndola dourada,

Pelo mar de rosas e brumas

Da fantasia.

Ronan Matos
Enviado por Ronan Matos em 10/12/2018
Reeditado em 12/05/2020
Código do texto: T6523907
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