FESTA DO INTERIOR
Fazia muito tempo, mas muito mesmo que eu não ia a uma festa de igreja numa cidade do interior e fui no sábado, véspera do dia das mães.
Foi na cidade de Ouro Fino, na região sul de Minas Gerais. Fui na companhia de minha mãe, meu irmão e minha cunhada. Chegamos por volta das 19 horas, havia pouco movimento na praça mas a igreja estava apinhada. Minha mãe e a cunhada entraram para assistir à missa enquanto meu irmão e eu sentamos numa mesa na praça a fim de tomar alguma coisa enquanto aguardávamos.
Foi então que algo chamou nossa atenção. Havia algumas pessoas conversando animadamente nas diversas barracas de comes e bebes armadas na praça mas ninguém consumia nada. Olhamos ao redor e percebemos que os caixas estavam fechados. Noutra olhada vimos os freezers onde estavam armazenados as cervejas e os refrigerantes completamente fechados e ainda por cima trancados com correntes e cadeados. Quando meu irmão viu aquilo comentou que na certa as chaves ficam com o padre, que só abre os cadeados após o término da missa. Rimos e ficamos ali jogando conversa fora e esperando que começassem a vender as fichas para consumirmos umas geladas, afinal, estávamos numa festa. Os minutos passaram, a primeira hora passou, mais meia hora e nada de começarem a vender as fichas. - Epa! Realmente algo estranho acontece aqui, pensei. E não é que após duas longas e intermináveis horas a missa acabou, as pessoas foram-se chegando à praça e só então começaram a vender os comes e bebes. Não sei se as chaves realmente estavam em poder do padre, mas foi o que me pareceu.
Aquele momento remeteu minha memória ao tempo em que era menino e ia às quermesses na cidade de Paranavaí, interior do Paraná. Eram apresentadas pela figura de um locutor(hoje substituído pelos termos DJ ou MC), que as animava por meio de um alto-falante onde anunciava recadinhos que a garotada mandava para seus paqueras, colocava músicas que eram oferecidas e no ponto alto da festa - o bingo - cantava as pedras. A qualidade do som deixava a desejar, é verdade, mas pelo menos a gente podia conversar com quem estava ao lado sem precisar fazer mímica ou gritar.
Ao retornar minha atenção para a festa, passei a apreciar os quitutes que meu irmão gentilmente trouxera à mesa, acompanhados de umas cervejinhas, agora já liberados(talvez pelo padre) para consumo. Verdadeiras delícias da culinária mineira desfilavam nas mesas ao nosso redor e não pude deixar de experimentar um prato típico local – um virado de frango, uma espécie de angú com pedaços de frango e um tempero delicioso. Pensei comigo – “esse trem é bão demais, sô” – como dizem os mineiros com muita propriedade. O som era da melhor qualidade e nada de recadinhos ou músicas oferecidas para paqueras, o negócio agora é profissional, com palco, jogo de luzes e música ao vivo, mas isso é “bão também”. Observei as pessoas sentadas, geralmente famílias numerosas que conversavam e riam. Pessoas simples, com um estilo de vida típico de uma cidade de interior (lembrei-me da família de meu pai, que é originária daquela região), aproveitando um dos eventos mais importantes da cidade – a festa da padroeira. Ou seria do padroeiro. Sim, porque pela primeira vez na vida eu estive numa cidade que tem dois - uma espécie de prefeito e vice, ou senador e suplente ou titular e reserva, sei lá. Saí da festa e fiquei imaginando se isso não causaria, de alguma forma, uma ciumeira dessas que a gente está acostumado a ver por aí entre as celebridades, onde um quer aparecer mais que o outro. Ou então uma rixa entre devotos, com suas bandeiras em punho desfilando em passeata ou carreata pelas ruas da cidade reivindicando a supremacia ou a titularidade do posto ao seu santo favorito. Mas prefiro acreditar que isso nunca irá acontecer, afinal, trata-se de um assunto de cunho religioso e não político. Se é que existe diferença entre eles. Bem, deixo isso pra lá, o fato é que por falta de santo a cidade não deixará de ter sua festa tradicional.