E assim, como brasileiro não disiste nunca, “tamos aí, ouvino cunversa fiada, tomano guarina e cumendo pão”
Tem umas coisas que para mim são mistérios insolúveis e inquestionáveis. Estava eu na prosaica tarefa de lavar pratos, coisa que – por sinal – odeio, quando me veio, em meio as loucas elocubrações desse meu juízo pensador (agora ocupado com o esqueleto do T-REX) desgovernado, a seguinte frase:
- Sou brasileiro e não desisto nunca!
Isso dito com aquela ênfase patriótica televisiva, que tem como objetivo engasopar incautos. Por que peste a pessoa pensa uma coisa dessa? Sei lá!
Não me pergunte. Pergunte ao T-REX, é capaz dele saber.
O fato é que brasileiro não desiste mesmo do que, hein? A gente não desiste de viver, de respirar, de comprar, de insistir em comer três vezes no dia ao menos, de ter direito à saúde pública d e qualidade, de ter segurança pública garantida...ou seja, a gente não desiste da obrigação fundamental do governo, a gente não desiste dos nossos direitos, é?
Ah! O T-REX caiu na gaitada, olha só.
A gente não desiste por que não tem nem do que desistir. Desistir como? Morrendo? Só se for...a mensagem subliminar é não morra não que um dia tem jeito? Desistir de viver no meio dessa recessão braba, que é a realidade única de todo mundo que ganha de três mil reais pra baixo, tenha ou não que pagar aluguel, se arrisque a comprar uma televisão nova?
E eu não estou – por que não faço – fazendo apologia de salário mínimo por que eu não acredito em gnomo, nem em et e nem estou aqui pra falar que eu sei o que é viver de salário mínimo, por que eu não sei. Nem a maioria dos que lerão estas palavras.
A gente não desiste por que nunca concordou em ser brasileiro e não desistir nunca. A gente vai fazer o que, hein? Se queixar a quem?
Vai se queixar ao Lula, que vai pra televisão falar errado e justificar o injustificável? Ele era sindicalista e na minha vida inteira eu nunca vi um sindicalista que não quisesse ser político, a fim de trabalhar ainda menos. Os eletrotécnicos da empresa de energia elétrica do meu Estado – pobre Estado – eram sindicalistas para não trabalharem, agora são evangélicos, políticos, ganham os tubos e até um deles conseguiu ser presidente da empresa, e fez as mesmíssimas merdas que os presidentes anteriores, os “reacionários” que ele atacava tão acaloradamente.
Homi! o Lula, para mim, é uma figura de ópera bufa, o congresso é uma ópera bufa, o senado é uma piada de mal gosto...a gente tá é lascado. A gente tá lascado e mal pago. Muito mal pago. Sou brasileiro e não desisto nunca! Ai, ai!
É tudo a mesma coisa, ruge o T-REX tranquilamente.
A terra desse povo político, é de “são saruê” onde tem rio de leite e de mel, pé de rapadura, pedra de charque, morro de qualhada e outras delícias.
A minha tem um supermercado com uma máquina registradora implacável – não se atreva a tirar a vista dos números, senão você toma um susto de morrer! – que conta cada centavo que as barrigas famintas dos meus exige.
E assim, como brasileiro não desiste nunca, cito Seu Osório, taxista e filósofo, “tamos aí, ouvino cunversa fiada, tomano guarina e cumendo pão”, bem no meio da rua Augusta, cruzamento com a Boa Vista, em plena tarde de terça feira, enquanto nos palácios degusta-se qualquer acepipe.