Fantasmas

É incrível como, de repente, nos deixamos às vezes assaltar por fantasmas. Fantasmas esses que deveriam estar enterrados há anos, há séculos. Fantasmas de coisas e pessoas que se foram há muito, queimadas até as cinzas. Seria falta de lágrimas choradas por elas? Não acredito; acho, até, que talvez tenham sido choradas demais e, por isso mesmo, retornam querendo provocar mais choro. Fantasmas não são coisas boas. Podem ter sido, em vida, mas se se foram foi por algum motivo. Não devem voltar. Seu lugar não é aqui, do nosso lado – um ghost às avessas, sem sentido e sem motivo.

Ou, talvez, os fantasmas sejam inevitáveis. Talvez estejam conosco mesmo, dentro de nós, e precisem sair, ficar livres para ir embora. Não sei. Sei que os fantasmas assustam, doem, machucam. Amedrontam. E não adianta querer ficar indiferente a eles: quanto mais os negamos e expulsamos, mais eles insistem, torturam, se fazem presentes. Ninguém consegue fugir de um fantasma: como nos filmes e nos livros, eles têm o poder de atravessar paredes, continentes, e perseguir-nos onde menos esperamos. Até dentro de nós mesmos.

Como e por que surgem, não sei. Sei que estão aí. Visíveis, invisíveis, mas presentes. Num telefone que toca. Numa voz que já estava esquecida. Num rosto que nunca saiu da memória. Que talvez nunca saia – mas que deveria sair. Graças a Deus , fantasmas não lêem crônicas, pelo menos que eu saiba. Se não, veriam que nos importamos com eles, para o bem ou para o mal. E percebendo seu poder, não mais nos deixariam em paz. É tão mais interessante atormentar quem se importa...

Se alguém souber de um meio de escapar deles, me avise, que eu ainda não descobri a fórmula. Alho e cruz são para vampiros, bala de prata para lobisomem. Mas, e para os fantasmas? Fantasmas de carne e osso, de toque, de olhar, de lembrança... Fantasmas que somem às vezes, que parecem extintos, mas que sempre retornam.

Que nos fortalecem, até, que nos aliviam ao percebermos a diminuição do medo a cada aparição, mas que se fortalecem também, ao verem que o medo ainda não sumiu de todo. Fantasmas que, embora neguemos, ainda queremos ver, e talvez atraiamos com recordações.

Os fantasmas existem, assim como os esqueletos nos armários. Sorte de quem não tem um para lhe assombrar...

Maristela Scheuer Deves
Enviado por Maristela Scheuer Deves em 29/02/2008
Código do texto: T880927
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