MSN DOS ANOS 60
Já escrevi outras páginas nas quais me referi ao Atheneu, colégio tradicional de Aracaju, uma instituição até hoje impossível de ser reproduzida.
Os jovens alunos dos anos 60 inventavam meios de comunicação: telefones feitos com caixas de fósforos e barbante, celulares dos nossos dourados anos; a língua do pê (vô pô cê pê); os códigos e um modelo de msn meio lá para o exótico.
Os alunos do turno da manhã sonhavam com as alunas do turno da tarde, e por aí a fantasia corria por conta de cada um numa espécie de ciranda. Quem começou, não se sabe, nem é necessário estudar isto a fundo. Basta a lembrança e este registro.
Perto do toque anunciando o encerramento das atividades, o msn já estava funcionando plenamente. Tinha até uns espiões que tentavam ficar um pouco mais para ler as mensagens enviadas para os contatos. Por sorte, a fiscalização não era relaxada e todos tinham que se retirar em fila indiana sob a supervisão que tudo via, menos o msn.
Você conhece aquelas carteiras escolares antigas feitas para dois alunos? As nossas eram desse tipo, fortes, madeira da boa, bem conservadas, fiches e até confortáveis. Ficávamos logo amigos ou inimigos do colega ao lado. As carteiras eram os nossos cps. Ali, nasceu o protótipo do msn conhecido hoje.
Mas, você deve estar em agonia para saber que peste de msn era. E eu já vou resolver o seu problema. Escrevíamos bilhetes daquele tipo de criação literária que só jovens sabem produzir. Havia de tudo: declarações de amor sem fim, letras de músicas românticas, desenhos, beijos de batom sobre a folha de papel, flores, ofertas, súplicas, convites, poemas, acertos. Não se dava número de telefone porque se o pai metido a fera atendesse, seria a derrota, a destruição de sonhos e planos.
As mensagens que eram elaboradas durante as aulas, escondidas sob as folhas dos exercícios, eram cuidadosamente dobradas, de tal forma que ficassem bem acomodadas nos cps de madeira. Ficávamos com as caras mais sonsas do mundo, fingindo tanto a ponto de jamais professor algum, por desconfiado que fosse, descobrir as mensagens.
Eram noites de insônia e de olheiras promovidas pelo suspense, esperando a resposta e imaginando como seriam os nossos contatos.
Acertei, após uma série de mensagens com o objetivo de me fazer difícil como era a exigência social, com um colega do turno da tarde para irmos à matinée (lembram desta palavra?) do Cine Rio Branco. Casa chique numa rua também chique, a João Pessoa.
Tudo ficou combinado na movimentação natural das mensagens, a descrição detalhada do tipo de cada um. Menti um pouco porque era muito magra e os meninos daquela década só apreciavam as que tivessem alguma carne. Menti mais porque também era exigente e não queria me encontrar com um feioso qualquer, ficaria complexada. Para melhorar mais a mentirada, disse que iria num vestido godê de bolinhas pretas em fundo branco, sapatos pretos. O vestido era um tubinho estampado e usei um tamanquinho em alta naquele momento.
Chegada a hora marcada, no local combinado, mesmo consciente de que, quem estivesse lá não encontraria a personagem criada, me senti nua e tinha certeza de ser reconhecida pelo rapaz que estava me esperando, conforme o combinado, e quase sem mentiras. Só não era o bonitão prometido. Criei coragem, passei bem ao lado da figura insignificante ali parada e entrei para ver o filme.