Reflexão de um mamão

Cerca de um mês atrás, recebi uma visita de um parente que passava pela minha cidade. Me surpreendi, não costumo receber visitas, e maior ainda foi a surpresa quando ele me mostrou o mamão que trouxe, era sem dúvidas o maior que eu já havia visto. Enorme!

Demonstrei minha surpresa com o tamanho da fruta, conversamos um pouco enquanto tomávamos um café e minha visita foi embora me deixando um problema: Detesto mamão! Seria um desperdício jogar fora algo tão grande e bonito, na verdade, qualquer comida jogada fora é desperdício, mas aquela situação parecia pior. Pensei em repassar o mamão para outra pessoa, mas não havia para quem. A solidão me atrapalhava até na hora de repassar um presente.

Sem ter ninguém para entregar, deixei o mamão de lado. A noite o peguei e cortei uma fatia, o pensamento sobre a solidão me fez ter compaixão pela fruta, não queria deixá-la sozinha. Percebe o sentido? Não é culpa dele se veio parar na casa de uma pessoa que odeia mamão e não tem outro lugar para ir, não merece ser desprezado por isso. Senti o cheiro, fechei os olhos e abri a boca. Parei por aí. Não conseguia morder. Coloquei a fatia em um prato e guardei novamente sentindo mais culpa ainda, pois, além de despreza-lo, havia dado a ele esperança de um futuro diferente.

No dia seguinte, pensei em fazer sorvete de mamão. Vai que o gelado misturado com leite disfarçasse seu gosto? Coloquei a fatia já cortada no congelador, mas durante o dia acabei esquecendo de continuar a receita. Veio novamente a culpa. Estaria eu ficando louca? Não pode ser normal tanta compaixão por um mamão, mas parecia que cada vez que eu abria a geladeira ele me olhava com os olhos marejados: “Por favor! Mude meu destino, eu tenho valor”. É, talvez eu esteja a beira da insanidade.

Por loucura ou não, eu decidi atender o pedido e mudar seu destino. No dia seguinte, fiz uma vitamina de mamão com iogurte, ficou uma delícia! Tomei tudo, enquanto sorria, cheguei até gargalhar depois do primeiro gole. Ainda restava metade da fruta na geladeira, a qual parecia comemorar junto comigo. Foi uma manhã muito feliz.

Apesar de ter gostado da bebida, não é algo que eu tomaria todos os dias, esperei para fazer e depois e acabei lembrando do mamão no final do mês, enquanto lavava a geladeira e o encontrei no fundo, apodrecido. Senti pena, remorso, me senti egoista. Eu sabia que ele não merecia aquele destino, apodrecido, esquecido, solitário por culpa exclusivamente minha. O jeito foi jogar fora, fiz isso enquanto prometia que seria menos egoista dali pra frente. As vezes, até compro mamão agora, mas do pequeno! Para não estragar esperando a próxima esperança de carinho em forma de vitamina.

Roana Beatriz
Enviado por Roana Beatriz em 03/08/2024
Código do texto: T8121033
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