Arame farpado
Hoje, com este frio uma tosse me pegou. Dizem que foram os anos de cachimbo, cigarro de palha, pinga.
Naqueles tempos, juventude, sentimentos de invencibidade me dominavam, nunca prestei atenção a saúde. Agora , na velhice, vejo as consequências.
Na fazenda era assim: acordar cedo, amolar a enxada e ir pra labuta com meu pai e irmãos. Lá pelo meio da manhã chegava a minha mãe trazendo o café e uma farofa de fuba numa sexta de vime. Junto com ela vinha o cachorro Julim.
E assim era a nossa vida. E assim o tempo foi passando: pai e mãe se foram, irmãos se casaram, e o José, o irmão a quem mais admirava, diferente no pensamento e na atitude um dia se foi.
Em uma manhã, enquanto tomavamos o café antes de ir pra roça, na cozinha, no calor gostoso do fogão à lenha nos falou:
"Hoje vou seguir meu rumo. O latifundiario destas terras, que nunca por aqui apareceu, não vai mais cercar os meus sonhos. Nao quero ser como gado, um animal submisso ao brilho prata destes arames farpados."
E naquela mesma manhã partiu, sem muita despedida. E desde então nunca mais o vimos.
Ao contrário de mim ele escolheu viver ao invés de sonhar.
E só agora eu sei: a velhice de quem passou a vida sonhando e não buscando é uma tristeza só...