Comentários. Divergências. Aprender a falar e a ouvir.
Há poucos dias, li um texto - de Cesar Ranqueta, se não me falha a memória - texto curto, que trata da incapacidade, indisposição - assim é melhor, entendo -, da má-vontade - melhor assim - de muita gente que, no papel de quem ouve, em ouvir o que outras pessoas lhe dizem, pois tem ela de, na condiçâo de quem ouve, entender que quem lhe fala pode - e é provável que o faça - apresentar idéias que a incomodem, que a tirem da zona do conforto, que lhe revelem um erro, ou dois erros, ou três, ou lhe provem que esteja redondamente equivocada em todas as idéias. É comum pessoas rejeitarem qualquer opinião contrária, não raro antes mesmo de a ouvirem, a moveram-las a vaidade, a presunção de superioridade intelectual, a se arvorarem donas da verdade - e penso que em toda pessoa estão presentes, no mais íntimo de seu ser, tais dons tipicamente humanos.
Quem expõe um pensamento, principalmente se acerca de questões tão esquivas, tão lisas, tais quais quiabos, como o é a política, a psicologia, a história, a sociologia, tem que se dispôr a ouvir contestações ao que disse, e não apenasmente, e necessariamente, e principalmente contestações, mas, também, simples ressalvas, acréscimos, observações que o obriguem a reconsiderar o que disse, a verificar se se está com a razão, ou, simplesmente, a se indagar se se tem certeza da correção do pensamento que expôs. As questões ditas humanas são demasiadamente complexas, ou excessivamente simples, para que uma pessoa se tenha, coberta de razão, e por mais inteligente que seja, na conta de quem tem o conhecimento de tudo o que aos humanos, sua psicologia, e seu espírito, e sua sociedade, pertence.
E o pensamento que se expõe pode vir por meio da conversa, do discurso, da fala, enfim, e do texto escrito. Neste caso, escrevendo-se, está-se a falar, a expôr pensamentos, e quem o faz tem de saber ler, e acolher, comentários divergentes, pensá-los, repensá-los, e reconsiderar, se for o caso, as idéias que expôs, aceitar observações que lhe apontem erros, falsos raciocínios, lacunas lógicas, ausência de informações.
E quem apresenta as divergências, tem de saber fazê-lo com respeito e educação que o trato civil pede. Não é porque se ouve (se lê) uma idéia da qual se discorda em tipo e grau que se pode faltar com a urbanidade que a educação ensina. Além disso, talvez a idéia da qual se discorda não seja a errada.