"O Fim do Mundo"
Acordei atordoado com o barulho do trânsito e da cidade se movimentando agitadamente. Minhas assombrações davam-me uma sensação estranha de armagedom, tragédia, terremoto, tsunami , etc.
Fui à praia. Caranguejos mortos na areia. Peixes suicidando-se. Moscas, muitas moscas. Enormes moscas. Urubus vomitavam a carniça imprestável e sucumbiam mortos. O sol assassinava a pele e os olhos. O calor insuportável encharcava os poros de suor. O odor de podridão tomava conta de toda cidade.
Crianças recém nascidas definhavam, cobertas de moscas varejeiras.
Corri desesperadamente, procurando uma luz qualquer nessa deformidade. Parei na banca de jornal. Busquei notícias que me esclarecesse esse caos. Vejo políticos sorrindo, ricos e prometendo aumento na ração do povo. Um homem de terno e gravata me aborda, aponta uma arma e toma meu sapato. Depois, ele me deu um santinho e me pediu voto nas próximas eleições, prometendo maconha a preços subsidiados. Agradeci. O governo aprova um novo imposto provisório por somente 30 anos para canalizar o fétido rio Amazonas e construir uma auto-estrada. Os classificados de órgãos anunciavam grande oferta de rins, depois que o governo autorizou o suicídio assistido pelo SUS, com um bônus extra e ração vitalícia para a família do voluntário.
Voltei para casa. Não havia água, nem luz. Era dia de rodízio. Chovia e a água da chuva corroia a lataria dos carros e matava as plantas.
Tinha um casamento para ir à noite. Não podia tomar banho. Pedi ao meu irmão se poderia banhar-me na sua casa e me emprestar um par de sapatos. Ele me enxotou sob ameaças de morte caso eu me atrevesse a usar sua cota de água. Desisti.
Cheguei tarde à festa, depois de conseguir um par de sapatos emprestado com o apontador do bicho. O garçom estava bêbado e provavelmente drogado. A cerveja estava quente. Tinha vômitos e salgadinhos espalhados pelo chão. Pisei em um salgadinho, talvez uma coxinha ou algo parecido. A coisa gritou e levantou vôo. As mulheres que restaram estavam contaminadas e imploravam, pegajosas, por carinho. A noiva jazia no chão, olhos inchados e pernas como um esquadro. Cheirava esgoto. O noivo acariciava com muita delicadeza uma cadelinha transgênica.
Resolvi abandonar a festa, quando fogos e tiros tomaram conta da cidade. Comemorações e gritos de desespero se misturavam com um toque ensurdecedor. Aumentava o clima de pânico. Neste momento tomei conhecimento que pior aconteceu. Um grande impacto tomou conta de todos os meus sentidos: meu time foi rebaixado para a segunda divisão!