A Menina
Ela chegou sorrateira como sempre, impossível adivinhar o que ela iria fazer.
Na verdade, não era preciso perguntar, porque ela não diria nada, nem com palavras,
nem com mãos ou olhos. Não trazia nenhuma expressão ou emoção que pudesse,
denunciá-la , seu rosto e seu corpo eram totalmente inexpressivos . Apenas chegou
no grande quintal de terra dura compactada onde seus irmãos e primos entretinham-se
com uma bola de meia, jogavam futebol. Nem se aperceberam da chegada da menina,
tão envolvidos estavam em seu jogo. Ela então pôs-se de cócoras rente a parede da velha
casa de tábuas enegrecidas pelo desgaste natural do tempo. Os seus olhos fitos no chão
acompanhavam as formigas que faxinavam sua casa, entravam e saiam do orifício na terra,
elas vinham de dentro do buraco com o grão de terra e depositavam no monte que já se
formara e retornavam para dentro da terra para buscar outro.
Assim a menina continuou por muito tempo sem ser notada, imóvel não tirava os olhos das
formigas, apenas continuava ali aparentemente alheia a tudo que não fosse às formigas.
Na verdade a menina apercebia-se de tudo à sua volta, e esperava, pacientemente esperava,
não se mexia, continuava ali absorta em sua estratégia. Olhava os meninos de soslaio, pelo canto
dos olhos, sabia que logo fariam uma pausa na brincadeira , então ela agiria. Então os meninos
deixaram a bola no quintal e foram tomar água de pote de barro, fizeram uma fila indiana para
para beberem e cada um aguardava a sua vez pegava a caneca de alumínio e metia - na dentro
do pote e enchiam - na e bebiam, após beberem passava a caneca para o próximo da fila e assim
sucessivamente até que todos estivessem saciados a sede. Então a menina se levantou -se,
caminhou em direção a bola de meia, pegou-a e dirigiu-se até a privada que ficava no fundo do
quintal e jogou-a pelo buraco diretamente no excremento acumulado, depois voltou para onde
estava anteriormente e na mesma posição continuou ali absorta em contemplar às formigas .
Não demorou muito e os meninos voltaram e não encontrando a bola de meia alvoroçaram-se,
gesticulavam e não entendiam como a bola havia sumido, então começaram a gritar: "ô mãe, ô tia,
nossa bola sumiu. As mães, as tias e as vizinhas vieram todas para acudirem aquele falatório.
"Estava aqui, deixamos aqui" e apontavam para o lugar onde deveria estar a bola. Então, alguém
entre os meninos gritou: _"Foi ela, foi ela, ela que pegou nossa bola e escondeu". Mães, tias , vizinhas
e todos os meninos aglomeraram-se em torno da menina: "foi você, foi você", a menina olhou-os nos olhos
olhando-os perplexa como se não estivesse entendendo nada. A mãe da menina perguntou a ela:
-"Fia você pegou a bola dos meninos?". A menina olhou fixamente o nada e respondeu "Não"!
A mãe pegou em sua mãozinha pequena e disse: _"vamos para casa", a menina a acompanhou sem
resistência deixou-se levar.
Os meninos deram o caso como perdido e logo começaram a planejar fazer outra bola de meia.
Alguém foi fazer uso da privada, era a vizinha que mal entrou saiu gritando: -"a bola, a bola" e apontava
para a privada, os meninos correram para ver e constataram a bola sobre os excrementos.
A mãe da menina que continuava atenta saiu a porta e disse: _"Estão vendo, a bola ai está, vocês
lá para encrencar com a minha menina" sua voz soou rouca e bravia e então cada uma foi voltando
às suas casas e os meninos empenhavam-se em resgatar a bola. A mãe da menina voltou para dentro
e postando-se em frente a menina disse:_" Fia não faça mais isso não, a bola de meia é o único
divertimento de dos seus irmãos e primos. A menina nada respondeu e também não demonstrou
nenhum sinal de arrependimento.
Que Menina!!!
AH meu Deus a menina era eu!!!
Tina Rosa
01/02-08/2022
Na Aldeia