É tempo de perdoar
A palavra “Sun”, que no livro chinês das mutações representa o vento, a suavidade, é o simbolismo que melhor personifica a capacidade de perdoar. Pois exatamente por ser vento, consegue penetrar e varrer os sentimentos nocivos, trazendo paz ao coração doente.
Todo coração que não perdoa está infalivelmente adoecido. E não me refiro só a desculpar as outras pessoas. Falo de perdão num sentido mais amplo. Falo de perdoar aquilo que te fizeram a zilhões de anos atrás, mas que ainda é uma pedra no seu sapato. Falo de perdoar até mesmo as circunstâncias que você nem lembra que resultaram em mágoa e principalmente, falo de perdoar a si mesmo.
Quando eu falo sobre a necessidade de perdoar, estou me referindo à disposição de permitir que o vento carregue as suas mágoas e limpe seu coração daquilo que te enfraquece, que te adoece, que te endurece...
Um compositor chamado Beto Guedes, que a maioria das pessoas mais jovens nem deve saber quem é, compôs uma música chamada Sol de Primavera que tem tudo a ver com a condição de perdoar, de apaziguar o coração. A música fala coisas do tipo: “...Quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos, quero ver brotar o perdão onde a gente plantou... Já sonhamos juntos semeando as canções no vento... Já choramos muito... Mesmo assim não custa inventar uma nova canção que venha nos trazer sol de primavera... abre as janelas do meu peito... a lição sabemos de cor, só nos resta aprender”
O sentido da canção é muito claro. O coração cheio de mágoas e assuntos mal resolvidos é como um longo período de inverno, onde os sentimentos foram pouco a pouco congelando. Mas não se pode viver só de inverno, pois se houver só o inverno, pouco a pouco as coisas vão deixando de brotar e tudo vai ficando sem vida.
Os primeiros ventos da primavera servem exatamente para isso, para derreterem suavemente o gelo do inverno que cobriu e adormeceu todas as sementes. E é assim que o perdão deve brotar no coração. Como a chegada da primavera.
O compositor mostra, quando canta que sonhamos e semeamos canções no vento, que antes de congelarmos o coração, éramos pessoas cheias de esperança nas coisas. E mesmo que já tenhamos chorado muito, como ele mesmo diz, não custa inventar uma nova canção, ou seja, não custa nada permitir que nossos sentimentos se renovem para trazer uma outra primavera ao nosso coração.
Finalmente a musica termina pedindo que sejam abertas as janelas do peito, pois sabemos a lição, bastando apenas aprender. Isso deixa claro que a nossa cura interior depende tão somente de nós mesmos. As respostas para uma vida mais feliz e livre das amarras do rancor estão em nosso íntimo e precisamos somente ter humildade suficiente para compreender que se nós sofremos em algum momento de nossas vidas, que isso também fez parte do produtivo processo de crescimento.
Não há nisso um aspecto de merecimento ou punitivo. Tipo: “eu mereço” ou “é castigo de Deus”.
Nosso merecimento nesta vida é sermos felizes e colhermos os frutos de nossos atos. Se os nossos atos foram bons ou ruins aí é que são elas.
E finalmente, embora eu possa contrariar as convicções de alguém, também não acredito que Deus castigue quem quer que seja. Deus tem para o mundo e para os seres humanos um propósito perfeito e certamente que Ele não se ocuparia em ficar castigando os seres humanos um a um. Você acreditar que Deus está espiando enquanto você burla a recomendação médica e come gordura para depois te causar um infarto é comportamento de quem acha que o universo gira ao seu redor.
Como eu já disse, o propósito divino não tem falha. E Deus é tão benevolente que dá à sua criação autonomia suficiente para fazer escolhas.
Portanto, se você quer atrofiar seu coração com o ódio, a raiva e o rancor, seja feita a sua vontade. Mas se você, assim como eu, também acha que a vida é curta demais para se carregar certos fardos incômodos, então saia para a vida e venha ver o sol.
Here comes the sun... thuru ruru... here comes the sun and I say… It´s alright!