Um ponto cego
Talvez chorasse se fosse dor, uma ponta qualquer de medo, um desengano desses que rasgam a seda, apaga-se a luz e acende na pele uma nudez solitária. Talvez chorasse se fosse a solidão a romper os olhos da noite com a lâmina cega da desilusão. Porque se chorasse talvez se banhasse com o sal do seu corpo desaguando tudo que nela represara doce e obediente. Ela era mansa de passos curtos distraídos, porém nunca se atrasava para seus compromissos, cumpria suas obrigações, cumpria seus dias, ela se cumpria.
Mas naquela tarde sentia um tremor por dentro quando tão brisa tudo em volta era turbilhão, e ela se viu num caminho sinuoso de pensamentos frios, esfregava o peito aquecendo o sentimento e dizia: vai passar... vai passar... ela não queria esmorecer, não queria desperdiçar sua alegria de sonhar, no entanto seus olhos castanhos de bordas esbranquiçadas teimavam em enxergar seu ponto cego, mas a menina retraía com a claridade e o olhar se perdia no silêncio que corria por dentro, abafado e úmido ele pulsava no seu labirinto e acelerava o seu coração que batia por ela, somente por ela... e isso era tão pouco, tão pálido, opaco, tão seco... talvez se eu chorasse... ela pensava naquela tarde que findava com seus cotovelos fincados na mesa, as mãos no queixo, o olhar parado na estampa da toalha onde uma flor saltando em cor criava um volume, aos olhos dela tomava vida... mas um ruído de piaçava vindo da rua a tirava do transe e a flor se achatava novamente sem vida e tudo passava, tudo passava pelos seus olhos distraídos quando no cesto de fruta uma maçã a atraiu vermelha e brilhante na casca lisa. Pegou a maçã e mordia cheia de sede e apetite enquanto a piaçava espaçava o ritmo da tarde em contraponto com os estalos das suas mordidas. Uma apatia ritmada foi descendo sobre seu corpo, seu olhar anoitecendo e tudo em volta se encorpava disforme. De repente ela chorava e mordia a maçã. Ela chorava e cumpria suas lágrimas.
Talvez chorasse se fosse dor, uma ponta qualquer de medo, um desengano desses que rasgam a seda, apaga-se a luz e acende na pele uma nudez solitária. Talvez chorasse se fosse a solidão a romper os olhos da noite com a lâmina cega da desilusão. Porque se chorasse talvez se banhasse com o sal do seu corpo desaguando tudo que nela represara doce e obediente. Ela era mansa de passos curtos distraídos, porém nunca se atrasava para seus compromissos, cumpria suas obrigações, cumpria seus dias, ela se cumpria.
Mas naquela tarde sentia um tremor por dentro quando tão brisa tudo em volta era turbilhão, e ela se viu num caminho sinuoso de pensamentos frios, esfregava o peito aquecendo o sentimento e dizia: vai passar... vai passar... ela não queria esmorecer, não queria desperdiçar sua alegria de sonhar, no entanto seus olhos castanhos de bordas esbranquiçadas teimavam em enxergar seu ponto cego, mas a menina retraía com a claridade e o olhar se perdia no silêncio que corria por dentro, abafado e úmido ele pulsava no seu labirinto e acelerava o seu coração que batia por ela, somente por ela... e isso era tão pouco, tão pálido, opaco, tão seco... talvez se eu chorasse... ela pensava naquela tarde que findava com seus cotovelos fincados na mesa, as mãos no queixo, o olhar parado na estampa da toalha onde uma flor saltando em cor criava um volume, aos olhos dela tomava vida... mas um ruído de piaçava vindo da rua a tirava do transe e a flor se achatava novamente sem vida e tudo passava, tudo passava pelos seus olhos distraídos quando no cesto de fruta uma maçã a atraiu vermelha e brilhante na casca lisa. Pegou a maçã e mordia cheia de sede e apetite enquanto a piaçava espaçava o ritmo da tarde em contraponto com os estalos das suas mordidas. Uma apatia ritmada foi descendo sobre seu corpo, seu olhar anoitecendo e tudo em volta se encorpava disforme. De repente ela chorava e mordia a maçã. Ela chorava e cumpria suas lágrimas.