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Na escola de Ensino Fundamental, a professora D. Lúcia, no contato diário com seus alunos, dirige-se a Matheus:
– Por favor, apresente suas tarefas.
– Professora, sabe, meu pai mandou pedir o seu e-mail.
– Matheus, não despiste. As tarefas para correção, vamos!
– Tia, meu pai quer acessar o seu site. Tá ligada?
– Pode uma coisa dessas, meu Deus? E ainda mais esse linguajar...
– Tia, tem computador?
– Não, Matheus. Meu ordenado não permite esses luxos.
– A senhora não navega?
– Eu?!!! Não sou Cabral, meu filho. Você tirou o dia para brincar, não foi? E, antes que eu esqueça, as tarefas, vamos!
– Professora, a senhora não fica conectada?
– Deus me livre!
– Por quê?
– Porque não sou tomada. Dá choque. Aproveitando o ensejo, o seu porquê é separado e com acento e o meu é pegado e sem acento.
– De que a senhora está falando?
– Ora, Matheus, do uso dos porquês.
– Por quê?
– Porque é necessário.
– Tia...
– Sim!
– Nosso endereço agora é getulio@.... Tome aqui neste papel que meu pai mandou. Getúlio é o nome de meu pai.
– Vocês mudaram de endereço? Seu pai agora é nome de rua? Qual o número da casa?
– Agora a senhora é que quer brincar.
– Eu?
– Sim. Eu disse o endereço no computador.
A professora estava no final da carga, prestes a ficar fora de área ou temporariamente desligada. Recomeçou, tentando treinar Paulo Freire:
– Meu amorzinho, como é mesmo agora o seu endereço, aliás, do computador de seu Getúlio?
– getulio@...
– Pesa tanto assim? Resolveu entrar no jogo a professora.
– Não, não pesa. É só segurar o mouse.
– Huum!!! Tá, e daí?
– Depois, a senhora clica.
– O mouse? Que terrível!
– Não, tia. É bonitinho.
– Bonitinho???
– Todo cinzentinho.
– Valha-me Deus!
– O quê?
– Nada, nada. Deixe. E então?
– Então, a senhora o empurra para lá e para cá.
– Nunca! Pegar em um rato, nunca! Que história de empurrar é essa, menino?
– Rato, não, tia. É mouse.
– Tanto faz, meu filho. Mouse é rato em inglês. Disto eu ainda lembro. Rato é um animal roedor, muito nocivo à saúde. Em português ou inglês, dá no mesmo, um animal nojento, pernicioso.
– Meu mouse não é nojento. É novinho e limpinho. E nem tem pernas.
– Limpinho, coisa nenhuma. Outra mais, pernicioso não significa que tenha pernas. Significa que é um animal perigoso para a nossa saúde. Vá imediatamente lavar suas mãos e trate de voltar para sala porque vamos estudar as capitanias hereditárias.
– Que tipo de doença é essa, tia?
Descarregou a bateria da professora excluída, analfabeta digital.