Quando os sinos dobram por nós
Por Everaldo Soares
Havia naquele dia algo de errado no mundo
Notei uma atmosfera de medo
Ouvi passos atrás de mim
E era a morte caminhando silenciosamente
Sob uma luz dourada que reluzia de algum lugar
Das janelas de algum prédio que eu não podia alcançar,
Dos corredores das enfermarias
Ouvi sua voz que dizia:
A morte é fluxo... a vida é mobilidade
A morte está para a vida assim como a
Correnteza na tempestade.
Pensei ainda que era melhor viver,
Enquanto um manto de cicatriz cobria a Terra.
E eram as feridas dos que partiram,
E o pranto dos que ficaram.
Não diga nada - disse a morte - observe.
Há uma eternidade clara como o dia e escura como a noite,
Girando para baixo e para cima
Para cima e para baixo
E que não se prende nem no presente nem no futuro.
Ninguém sabe dizer onde começa ou termina,
È a impermanência da vida... a morte.
Eu não disse nada, senti um medo terrível,
Ouvi depois um longo toque de recolher
Sobre a Terra,
O mundo havia se tornado um lugar perigoso.
Ninguém escapou do pesadelo da morte naquele dia,
Cada manhã descia com a mesma agonia da manhã
Que antecedia.
As pessoas desesperadas fugiram no
Cavalo de batalha de suas crenças,
Compreendi que os pesadelos não eram
Nem a metade do medo do mundo real - continuei observando.
A morte é fluxo... a vida é mobilidade - continuou a morte -
A banalidade de uma geração descende da
Banalidade de outra geração.
Muitos vivem como zumbis, se movem, respiram, mas não
Tem humanidade,
Nem indagam sobre o sentido da vida - dizia ela.
A impensada capacidade de pensar
Levou muitos a acreditar que tudo o que reluz é ouro,
Construindo Templos reluzentes, para preencher o Vazio da crise existencial.
Criaram religiões
Inventaram doutrinas
Até perderem-se no pântano escuro de sua própria estupidez.
A voz cessou por um instante, e eu compreendi que
Cada criatura é em si mesmo o seu próprio Templo e
Sacerdócio, juiz e sentenciado.
Compreendi o quanto os homens são como cães,
Presos na coleira de seu próprio ego.
Vem outros homens e atacam sua integridade,
Roubam os seus bens e tiram sua
Liberdade, e eles não fazem nada
Porque os cães esquecem facilmente a
Arrogância de seus donos. Eu estava perplexo.
Uma coisa atraiu minha atenção;
Uma aura de luz irradiou por toda a terra, e
Eram as orações daqueles que se curvaram respeitosamente
Diante do amor ao próximo.
A esperança tem o escudo radiante da fé - Disse me a morte -
È um território místico, uma pátria sem bandeira,
Um navio fantasma com vozes que jamais serão
Ouvidas por aqueles que não a detém.
Porque toda a esperança é revelada na vida,
Assim como toda a vida é revelada na morte
Porque toda morte é fluxo.
A luz dourada que reluzia no fim do túnel
Me convidou a entrar .Em algum lugar repicava um sino,
E uma voz bem calma chamava por mim...
Então compreendi tudo.
everaldo.uni@gmail.com