O REI FRANCISCO TONDORÔ
Assim que o dia amanhecia ele descia para o comércio. O saco de estopa e várias mochilas penduradas no ombro, voltadas para as costas. Uma pasta preta com aspecto de relíquia de lixo, a tiracolo. Passava sério e simpático, elegante. Bom dia! Bom dia para cada um, ele dizia.
O comércio fechava para o almoço. Ele subia de volta. O saco e as sacolas quase até a metade. A pasta, não! Segundo Tondorô, a pasta continha só documentos: ministeriais, presidenciais, das autoridades, altezas e realezas sereníssimas de todos os cantos do mundo, e eras. Telegramas de homens ilustres, cumprimentos, elogios, intimidades. Mas, se alguém puxasse assunto, ele fazia questão de ler os textos telegráficos. SUA MAJESTADE TONDORÔ, EXCELENTÍSSIMA, ILUSTRÍSSIMA, DIGNÍSSIMA, ALTEZA REAL (misturava tudo!), REI FRANCISCO DE NÃO-SEI-DAS-QUANTAS, TONDORÔ. HONRA CONTAR INSIGNE PRESENÇA SOLENIDADE CASTELO DO REI NABUCODONOSOR. ESPERANDO CONFIRMAÇÃO REAL.
Às dezoito horas as portas das lojas fechadas, encerravam mais um turno de trabalho. O rei Tondorô, magro, majestoso em seus farrapos (o saco e as sacolas atopetados de papel recolhido nas calçadas), voltava. Ia para casa, isto é para o seu castelo de celulose. Uma vez ele subiu a ladeira e sumiu do mapa.
Aju, março de 2005