JOÃO BABÃO

JOÃO BABÃO

A meninada se divertia, imitava e acompanhava João Babão em sua loucura, sua paixão pelo volante.

Um sujeito novo, feioso, o rosto torto, a boca quase alcançava a orelha direita. Sua voz era um urro. Os dentes encardidos, sebosos, salteados. A baba descendo fina pelo canto da boca espumosa. Rapidamente o fio de baba engrossava e atingia a roupa, empapando-a. Pés descalços, camisa aberta ao vento do seu próprio movimento.

Um dia descia rua abaixo com um carrinho-de-mão barulhento. No outro descia com um automóvel fabricado pela sua imaginação. Ligava o "automóvel", emitia o barulho do motor, passava a primeira, a segunda, e assim por diante. Dava até a marcha-à-ré. O fogo apagava. João não desistia. Colocava em ponto morto, baixava o freio de mão. Reiniciava lento, posudo, feliz, aumentava a velocidade, fazia manobras, curvas, cavalos-de-pau, acelerava, reduzia, freiava, cantava pneu, fazia toda a sonoplastia. Os meninos, atrás dele, se aproveitavam dos sonhos daquele tolo.

João Babão! Olha o João Babão! E ele ria satisfeito, buzinando no ar o seu veículo de sonho. Sentia a glória conferida por aquela platéia, aquele ibope de meio de rua. E se esbaldava nas estradas da imaginação misteriosa dos doentes mentais.

Aju, março de 2005