2.841/502 - BR.RS de 16 de março de 2021

Ao ver aqui no Portal de Notícias que o Rio Grande do Sul bateu ontem novo recorde trágico de vítimas fatais da pandemia notificadas (1) num único dia, 502, lembrei que escrevi neste mesmo espaço um texto no dia 10 de março onde citei uma fala da secretária de Saúde do Estado justificando a prefeitos, no final de fevereiro, que sem as medidas rígidas da bandeira preta poderíamos chegar a 200 mortes diárias em março. Tivemos, de lá pra cá, pela ordem, sucessivos recordes de notificação diária da desgraça: 185 (2 março), 188 (4), 275 (9), 276 (11), 331 (13) e essas 502 (16), agora.

A Região Carbonífera, por seu turno, com as 9 mortes de ontem, soma 58 em 16 dias, número correspondente a 26% de todas as mortes ocorridas por Covid-19 em quase 12 meses de pandemia na região, que serão completados no sábado, dia 20. Minha cidade, Charqueadas, é a mais atingida e, com as quatro mortes de terça-feira, chega a 17 desde 1º de março, ou seja, registrou mais do que um óbito diário no período. Isso dá, em 16 dias, 38% das mortes totais por Covid-19 na cidade em 12 meses. Tais números, sem vida e sem oxigênio, são tétricos e informam a gravidade de um momento que pode até ficar pior, não se sabe o quanto e até quando.

Todas essas pessoas vítimas da pandemia, da insensatez, do desatino, da cegueira ideológica, do fundamentalismo político-econômico-religioso, em suma, do negacionismo que grassa em setores e grupos sociais e em níveis de governo, todos contribuindo para desestimular o povo a se cuidar e o estimulando a ignorar as recomendações de prevenção epidemiológicas, em especial o - mais do que nunca - necessário e vital isolamento social. Um quadro terrível de óbitos desenfreados, colapso hospitalar crescente e possíbilidade de colapso funerário.

Esse mal não pode ser banalizado, essa catástrofe humana não pode ser naturalizada, pois ela é, isso sim, uma construção social, política e econômica a agravar nefastamente o potencial letal da pandemia. Vemos também que, por outro lado, tanto o modelo do Distanciamento Social Controlado RS quanto as medidas municipais, infelizmente, não tiveram capacidade de prever e evitar o que está acontecendo. Assim, como se falar, no momento, em volta as aulas ou flexibilização de regras do isolamento social? Isso parece total falta de bom senso, à revelia das recomendações da ciência epidemiológica num momento de inédita gravidade do qual se ignora a que tamanho chegará.

Aliás, essa palavra, "flexibilização", tem sido usada com um viés ideológico economicista que defendeu reformas como a da Previdência e a trabalhista, que nada de bom trouxeram para o povão que vive de salário. Entretanto, nenhuma destas teve um efeito tão perverso e devastador quanto a sua utilização na pandemia a assolar o Brasil. Vamos fazer uma breve comparação ilustrativa. No passado registramos algumas tragédias envolvendo vítimas fatais e que geraram uma comoção nacional no país: Bateau Mouche, RJ, em dezembro de 1988, com 55 mortos; Boate Kiss, RS, em janeiro de 2013, com 242; Barragem Mariana, MG, novembro de 2015, com 18; e Brumadinho, MG, em janeiro de 2018, com 259 mortes. Os números divulgados somente ontem no Rio Grande do Sul correspondem ao dobro de vítimas da Kiss ou, também, a soma das da Kiss e de Brumadinho. As vítimas por Covid-19 do Brasil na mesma data, 2.841, equivalem a 5x as vítimas das tragédias acima citadas somadas!

Logo, como minimizar ou naturalizar uma catástrofe humana de tamanha dimensão? Inaceitável! Criminoso! O que fazer? As únicas coisas que realmente funcionam e que não cansaremos de repetir aqui no Portal de Notícias: fique em casa, use máscara, observe o distanciamento social, etc, etc, etc. E torçamos para que a vacinação acelere o mais rapidamente possível.



(1) - Os óbitos notificados em determinado dia não correspondem, necessariamente, aos ocorridos na data, mas sim ao total de casos que, após análises e testagem, são nela, definitivamente, divulgados. Assim, correspondem efetivamente ao acumulado do período imediatamente mais próximo daquele dia, dando a dimensão ampla e real do problema. Para ilustrar e comparar isso, podemos ver que, em relação as datas mencionadas no texto acima, o RS teve o seguinte número de mortes, conforme dados da Secretaria da Saúde RS: 2 de março - 160 óbitos, 4 - 188, 9 - 201, 11 - 229, 13 - 165 e 16 - 23.