Lutos Vários
Hoje completa 25 anos da partida precoce de Caio Fernando de Abreu. Partiu aos 47 anos em decorrência de complicações da Aids em 25 de fevereiro de 1996.
Em mim, dentro do peito e do espírito, revivo as angústias do seu conto Os Sobreviventes, que ele recomenda lê, ouvindo Ângela Ro rô.
Em mim, o mesmo sentimento daquele seu ser. Em esforço diário para ser uma sobrevivente ao esgotamento dessa dura realidade na qual as utopias não se concretizam, revelam-se sonhos e morreram antes de vingar.
Visto meus lutos vários: sociais, espirituais e por que não dizer sanguíneos. Todo luto é doído, sentido e pesaroso. Pelo menos em mim. Contudo, a orfandade das coisas, amores... quando nos são arrancados de maneira precoce, sem cumprir o natural da velhice ou sem a chance do reverso, faz-nos sobrevivente.
Talvez por isso esse conto, hoje, quando sou três anos mais velha que Caio Fernando de Abreu, quando nos “orfandou”, faça para mim mais sentido do que quando o li pela primeira vez no vigor de meus idealismos.
Esse conto sempre me impacta, ainda que eu o leia sem ouvir a Ro rô, como hoje. Sua atualidade no que tange à repressão política e moral, às descobertas da sexualidade, individualidade, angústias, ideais...
Assim como no conto, muitas das minhas utopias individuais e coletivas não se concretizaram, e sinto fortemente que o meu tempo de validade se esvai, como também somem as esperanças e as certezas que um dia já tive.
Hoje, ante tantas mazelas, fora e dentro de mim, o desfecho do conto Os Sobreviventes é mais que um anseio, é quase uma oração: “Te desejo uma fé enorme, em qualquer coisa, não importa o quê, como aquela fé que a gente teve um dia, me deseja também uma coisa bem bonita, uma coisa qualquer maravilhosa, que me faça acreditar em tudo¹ de novo”
Eu preciso acreditar de novo!
¹Trecho do Conto os Sobreviventes, de Caio Fernando de Abreu, publicado originalmente em 1982 no livro Morangos mofados.