O ovo da serpente
No ano de 1965 existiam quatro emissoras de televisão no Rio de Janeiro: a TV Tupi (canal 6), a Rio (canal 13), a Continental (canal 9) e a Excelsior (canal 2). Então foi lançada a TV Globo.
Parecia um outro mundo aquele longínquo ano. Meu pai ainda trazia religiosamente, voltando do trabalho, o exemplar de "O Globo", que ainda era um jornal agradável de ler, com boas matérias. Só anos depois ele iria cortar um pouco essa despesa, porque em termos monetários a vida foi ficando mais difícil e a compra diária de jornal começava a pesar.
Sem o senso crítico desenvolvido naquele tempo eu via muita televisão e fiquei entusiasmado com a chegada da Globo. Ela já chegou com muitas séries que eu procurava assistir. No começo gostei muito de "A feiticeira", com o tempo mudei de opinião e deixei de gostar, pois a história toda se baseava em mentiras, dissimulações e constrangimentos. Tinha o "Mister Ed", um cavalo falante mas que só falava com o dono (ninguém mais se lembra). Era o tempo dessas comédias familiares de tv. O Gato Félix em nova roupagem me decepcionou. Sem o charme dos velhos desenhos era uma coisa chata e repetitiva que invariavelmente terminava com o felino dando uma gargalhada estúpida. O Hércules apareceu como um super-herói da antiguidade, num desenho tosco e bobo. E existiu um seriado policial da própria emissora. Era qualquer coisa como "Cidade aberta" e o protagonista era um fictício repórter do jornal "O Globo", repórter policial que fazia suas investigações.
Esta série existiu e foi completamente esquecida, mesmo sendo uma das primeiras da televisão brasileira.
Havia o programa da "Câmera indiscreta" que na verdade era na base de pegadinhas e apresentado pelo comediante Renato Consorte. Hoje eu vejo tais programas como um desrespeito às pessoas enganadas para ficarem em situações ridículas.
O "Tevefone" era um interminável programa de auditório dos sábados, apresentado por três conhecidos "disc-joqueis" como se dizia na época: Jonas Garret, Mario Luís e Luiz de Carvalho. Eu tinha fôlego de ficar assistindo, hoje me envergonho por ficar tanto tempo em ociosidade considerando como esses programas são frivolos. Sim, em adolescente eu era viciado em televisão mas com o tempo me libertei.
E havia a dramaturgia brasileira "Rua da Matriz", mas novelas propriamente só surgiram mais tarde. Creio que por volta de 1970 já se desenhava na Globo a predominância das novelas, cada vez mais imorais.
Outra façanha da Globo foi sequestrar Roberto Carlos de seu público e seus companheiros, situação que se prolonga até os nossos dias.
Felizmente a novidade cansou e eu deixei de me interessar tanto pela Globo, cuja programação só piorou de então para cá.
O ovo da serpente chocou e dele saiu uma aspide das mais venenosas.
Rio de Janeiro, 11 de fevereiro de 2021.
No ano de 1965 existiam quatro emissoras de televisão no Rio de Janeiro: a TV Tupi (canal 6), a Rio (canal 13), a Continental (canal 9) e a Excelsior (canal 2). Então foi lançada a TV Globo.
Parecia um outro mundo aquele longínquo ano. Meu pai ainda trazia religiosamente, voltando do trabalho, o exemplar de "O Globo", que ainda era um jornal agradável de ler, com boas matérias. Só anos depois ele iria cortar um pouco essa despesa, porque em termos monetários a vida foi ficando mais difícil e a compra diária de jornal começava a pesar.
Sem o senso crítico desenvolvido naquele tempo eu via muita televisão e fiquei entusiasmado com a chegada da Globo. Ela já chegou com muitas séries que eu procurava assistir. No começo gostei muito de "A feiticeira", com o tempo mudei de opinião e deixei de gostar, pois a história toda se baseava em mentiras, dissimulações e constrangimentos. Tinha o "Mister Ed", um cavalo falante mas que só falava com o dono (ninguém mais se lembra). Era o tempo dessas comédias familiares de tv. O Gato Félix em nova roupagem me decepcionou. Sem o charme dos velhos desenhos era uma coisa chata e repetitiva que invariavelmente terminava com o felino dando uma gargalhada estúpida. O Hércules apareceu como um super-herói da antiguidade, num desenho tosco e bobo. E existiu um seriado policial da própria emissora. Era qualquer coisa como "Cidade aberta" e o protagonista era um fictício repórter do jornal "O Globo", repórter policial que fazia suas investigações.
Esta série existiu e foi completamente esquecida, mesmo sendo uma das primeiras da televisão brasileira.
Havia o programa da "Câmera indiscreta" que na verdade era na base de pegadinhas e apresentado pelo comediante Renato Consorte. Hoje eu vejo tais programas como um desrespeito às pessoas enganadas para ficarem em situações ridículas.
O "Tevefone" era um interminável programa de auditório dos sábados, apresentado por três conhecidos "disc-joqueis" como se dizia na época: Jonas Garret, Mario Luís e Luiz de Carvalho. Eu tinha fôlego de ficar assistindo, hoje me envergonho por ficar tanto tempo em ociosidade considerando como esses programas são frivolos. Sim, em adolescente eu era viciado em televisão mas com o tempo me libertei.
E havia a dramaturgia brasileira "Rua da Matriz", mas novelas propriamente só surgiram mais tarde. Creio que por volta de 1970 já se desenhava na Globo a predominância das novelas, cada vez mais imorais.
Outra façanha da Globo foi sequestrar Roberto Carlos de seu público e seus companheiros, situação que se prolonga até os nossos dias.
Felizmente a novidade cansou e eu deixei de me interessar tanto pela Globo, cuja programação só piorou de então para cá.
O ovo da serpente chocou e dele saiu uma aspide das mais venenosas.
Rio de Janeiro, 11 de fevereiro de 2021.