Uma carta para alguém

Tenho andando sumida tanto no papel, quanto lá fora. Pensei em te escrever porque assim estarei olhando para dentro quando escrevo, são as coisas externas que me preocupam. Achei por muito tempo que eu fosse uma pessoa invisível, e acabei me perdendo nisso, outro dia quando cai na real da minha existência e o lugar que eu ocupo nessa cadeira, nessa casa, nesse universo tive a impressão de que me encontrar seria a coisa mais doida/doída que fosse fazer depois ter saído da barriga da minha mãe. E tive medo medo de que me encontrar acabasse sendo uma coisa cruel, porque não parece existir lugar para andar mais depois que a gente se encontra. De repente, em algum momento a gente toma consciência e fala com firmeza que coca-cola faz mal, no fundo a gente sabe as coisas que fazem mal, mas o momento da consciência é aquele que mais te pega de surpresa. Porque até então tudo era brincadeira, beber & fumar escondido dos pais, em outro momento, pertíssimo desse, as contas já aparecem para pagar, e os nossos pais já não são mais tão responsáveis com eles próprios, a gente repara, quando visita né, porque chega uma época em que você é uma mera visita na casa deles, porque você está pagando aluguel em outro lugar. Era início de noite e eu queria que deus existisse. Mas não pensa que estou triste, nem nada, não quero pedir nada para deus. Cética, você sabe. Mas olhei no relógio 20h36 e apenas pensei "eu queria que deus existisse". Pensamentos estranhos para se ter essa hora, enquanto eu finjo que estou cumprindo uma obrigação da vida adulta, que consiste em esperar, no meu caso, respostas para uma entrevista, trabalho de faculdade. Você vive e vê que os sábados não são mais os mesmos, ohhh, às vezes a espera deles são só para descanso, nada que envolva conversas demais e música alta, só você ali uma música e um cigarro talvez, dois, etc. Conheci um pouco mais sobre o amor, mesmo que ainda fica a impressão da sua competitividade com os sinônimos da palavra incógnita, mas tem um lado doce. Estar entediada, com fome e sozinha em casa não é uma das melhores sensações, mas se você for esperto em vez de preparar algo pra comer, vai parar aqui que nem eu, escrevendo e com fome. Seja esperto, no sentido às vezes mais filha-da-puta da palavra, porque ao olhar para trás você percebe que deveria ter sido. Resolvi te escrever hoje, em meio a tudo porque eu ainda penso no outro/nos outros, "como fulano deve estar tem tempo que não o vejo" e quando você percebe tem tempo real que você não vê esse fulano. As pessoas estão aí para isso, sumirem às vezes e não voltarem nunca mais na maioria delas, se derem sorte. Estou te escrevendo não por azar de ter voltado (risos), mas por sorte. É, às vezes as voltas são controversas e boas. E em meio a tudo, escrever é muito bom, só que eu preciso finalizar porque estou com fome.

Anny Ferraz
Enviado por Anny Ferraz em 17/10/2020
Reeditado em 25/10/2020
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