O texto e o contexto

Interpretações diversas sobre um mesmo fato são comuns. Algumas vezes por desconhecimento, outras até por má fé. A explicação para muitas dessas informações pode ser dada pela expressão “o texto fora de contexto, é pretexto”.

Explico melhor: em 2013, por ocasião da morte de Nelson Mandela, personalidades do mundo inteiro deslocaram-se à África do Sul, para o último adeus ao grande líder sul africano. Pelo que representou para o mundo, na luta contra a discriminação racial que ultrapassou as fronteiras do seu país, nada mais justo que até as barreiras políticas fossem quebradas e todos, irmãmente, se juntassem a essas celebrações. Assim aconteceu no Brasil, que por um momento esqueceu as divisões partidárias e foi representado na cerimônia pelos seus últimos presidentes da República ainda vivos. Viu-se, por conta disso, a foto no avião presidencial reunindo a presidente da época, Dilma Rousseff, e os ex Luiz Inácio da Silva, Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor de Melo e José Sarney. Outros, se vivos estivessem, também sairiam na famosa foto. Realizavam ali o que os “reclames fúnebres” das emissoras de rádio, do meu tempo, chamavam de ato de fé e piedade cristã. A essa explicação chamaremos de “texto e contexto”. Ou seja: o que aconteceu e a circunstância em que o fato se deu.

A proximidade eleitoral leva a muitas discussões. Umas interessantes, outras nem tanto. Algumas fundamentadas, outras só para “encher linguiça”. Mas as redes sociais estão aí para isso mesmo, para permitir tudo. Como as discussões partidárias costumam ser bem acaloradas, uns defendendo com tudo e outros atacando como podem, não poderiam deixar de “ressuscitar”, periodicamente, a tal foto dos presidentes, todos eles sorridentes, com a legenda: “Enquanto vocês brigam, eles se refestelam”. Isso é o que chamaremos aqui de “pretexto”. Ou seja: o texto (a fotos dos ex) fora do contexto (a ida para o funeral de Mandela) é o pretexto que encontram para dizer que é tudo “farinha do mesmo saco”. “Enquanto vocês brigam eles estão juntos e felizes, sem nenhuma diferença entre eles”.

Essa história me veio à lembrança por conta de uma conversa que tive com um dos meus netos numa caminhada entre a casa e a escola de inglês. Falávamos sobre sinônimos e começamos uma disputa sobre como dizer que uma pessoa se deu mal em uma determinada situação. As respostas foram desde “deu errado”, “lascou-se”, “dançou”, “acabou”, “perdeu” até um (e isso foi da minha parte) “f...”. É claro que ele se espantou dizendo: “- Vô?...” e riu de dobrar.

Foi o momento então do aprendizado iniciado com a pergunta: “- O que você acha que significa a expressão “o texto fora de contexto é pretexto?”. O resumo: é claro que se ele dissesse para alguém que o “vô falou f...”, certamente que essa pessoa, sem saber o contexto em que essa palavra estava sendo usada, condenaria o vô pelo uso de termo de baixo calão com um neto de, à época, onze anos. Mas, devidamente explicado, que estava procurando sinônimos para uma mesma situação, a explicação tornaria aceitável o seu uso e a condenação poderia ser revista. Sendo assim, para não cometer equívocos de interpretação, que tal procurar sempre contextualizar os fatos? Vamos nessa?

Fleal
Enviado por Fleal em 22/09/2020
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