O Paradoxo da Democracia

“Tolerância ilimitada culminará no desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada até para aqueles que são intolerantes […], então os tolerantes serão destruídos, e junto com eles a tolerância.” (Karl Popper)

A construção de uma sociedade civilizada é um exercício constante de práticas democráticas. É uma caminhada longa de avanços e retrocessos. Do ponto de vista histórico deveríamos estar num patamar melhor. Quando pensamos ter evoluído, as forças do retrocesso instaladas, tanto na sociedade civil, quanto nas instituições retardam esta caminhada. E muitas vezes os retrocessos levam a ditaduras.

Jair Messias Bolsonaro, goste ou não, foi eleito. O que precisamos entender é se o processo que o levou à presidência foi realmente democrático. Num modelo de democracia frágil sempre existe o risco de fraudes eleitorais, golpes, além de as disputas serem desiguais. As condições econômicas deste ou daquele postulante pode ser um fator decisivo, ou quem tem uma mídia a seu favor. A grande mídia concentrada, é um fator decisivo. É justo que apresentadores de programas de tevê e rádios sejam candidatos? Isto não configura uma disputa injusta? Os proprietários de rádios e tevês podem se manifestar nestes órgãos de concessão pública as suas preferências políticas-eleitorais?

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Com a a internet, uma nova ferramenta influencia o processo eleitoral: as redes sociais; as fake news e os engenheiros do caos, que por meio dos algorítimos constroem mensagens e propostas para os variados perfis de pessoas. Vários candidatos de extrema direita recorreram aos engenheiros do caos, para disseminar, via robôs, as suas mensagens populistas: Viktor Orbán, na Hungria, Donald Trump nos Estados Unidos, Jair Bolsonaro, no Brasil.

Para além do processo eleitoral, a democracia precisa ser fortalecida em outras instâncias, como o Judiciário e o Ministério Público. Juízes e procuradores nomeados podem imiscuir-se na política? A nomeação é democrática?

É democrático um empresário coagir seus empregados a voltar nos candidatos de sua preferência?

Viver numa sociedade democrática é conviver com a divergência entre indivíduos e grupos. Cada um com seu projeto de organização social.

Como impedir que as forças anti-democráticas atuem? Não seria um paradoxo? N' outros termos, até que ponto podemos tolerar a intolerância, sem sermos devorados por ela? A minha liberdade vai até onde começa a do outro. Então não há liberdade total. Nenhum cidadão pode sair por aí dando tiros, dirigindo na contramão. Daí a necessidade da regulação, das leis, do pacto social. Votamos então ao processo eleitoral.

A democracia é um espaço da diversidade, contudo a correlação de forças é desigual. Buscar este equilíbrio é um desafio a todos e todas que realmente desejam viver numa sociedade livre, mas intolerante com a intolerância.

"Se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver flores, valeu a sombra das folhas; se não houver folhas, valeu a intenção da semente." (Henfil)

Quem quiser aprofundar sobre a influência das redes sociais, youtubers, fake news, teorias de conspiração, facebook, algorítimos, etc, sugiro ler Os Engenheiros do Caos, de Giuliano Da Empoli.