Diante do Rei

Diante do palácio está um porteiro. Não me pergunte o que aconteceu com os guardas. Francisco K. chega a esse porteiro. Tem consigo uma pasta com vários papéis em branco e preenchidos para fazer contas e operações matemáticas das mais variadas. Pergunta ao porteiro se pode entrar, mesmo que a porta já esteja aberta ainda naquela hora da noite. O porteiro diz apenas:

- É possível. Mas agora não.

- Então esperarei.

Francisco se recosta na parede do palácio. Raciocina que o rei possa não ter avisado todos de sua visita ou que talvez esteja ocupado com os deveres reais.

- Essa parede é propriedade do rei - diz o porteiro -, assim como tudo o que se pode ver adiante. É preciso ter permissão para continuar aqui.

- Mas eu fui...

- Não pode permanecer aqui a não ser que tenha permissão. Então, tem ou não?

- O quê?

- Bem vejo que não tem. Então saia. Desista.

- Desistir do quê? O próprio rei solicitou em carta... Me chamaram para trabalhar...

O porteiro então solta uma risada.

- Já disse: Desista!

- Como posso...

Francisco K. então reparou como o porteiro ria descontroladamente virando o torso e o pescoço de lado, escondendo-se, como se quisesse guardar o riso só para si. O homem se senta mesmo com a proibição.

Não tarda e surgem três homens vestidos com roupas muito cômodas e práticas. K. se pergunta se também foram convocados pelo rei para prestar-lhe algum serviço. Talvez tivessem mais sorte que ele e o ajudassem a passar também. Um deles se põem em frente a Francisco K. Os outros dois ficam mais trás.

- Ele disse que quer ver o rei. – diz o porteiro. – Diz que vai permanecer aqui até que o deixem entrar.

Todos os três homens caem em uma gargalhada gostosa e sonora.

Enfurecido, K se levanta e diz:

- Para mim já chega. Vou embora.

- O senhor não tem esse direito. Está detido.

- Mas o quê? Deixem de comédia!

Os homens se aproximam e formam uma meia lua. O porteiro não se move, apenas desvia o olhar quando o de Francisco K. lhe é dirigido.

Os homens agarram K. pelos braços. Ele tenta balbuciar, mas vê que é inútil. Diz apenas, antes de descer os degraus, olhando para a porta ainda aberta:

- Como um cão!

Andoru
Enviado por Andoru em 14/07/2020
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