Memórias: Nem só de pão vive o homem!!!
Minha infãncia foi boa enquanto meu "pai" bancava a minha tia Anita. Depois que ele parou virei escravo e o fato mais marcante, além de passar os domingos ao lado da mesa de jogo comprando cerveja e cigarro, foi o de ter que usar os sapatos 43 de meu tio José várias semanas, isso com 13-14 anos.
Meu tio José era um pouco escuro demais para o padrão familiar e talvez por isso pouco participava das festas familiares, inclusive a maior, a natalina. Sua mulher, Tia Edwiges também era quase invisível, a ponto de eu ter ficado 2 meses em Rio Negro-Paraná (1981) e só tê-la visitado no último dia, o que a deixou muito triste.
Me lembro que tio José chegando de viagem ia visitar minha tia Anita, antes de ir para casa. Neste dia tia Anita ficou muito feliz e mandou-me comprar 5 pães a mais. Cheguei com a encomenda quentinha, ( uns 12 pães) ja era umas 3 horas e nada de o Tio chegar. Resolvi comer um enquanto estava quente, cortei-o, passei manteiga nos 2 lados que se espalharam generosamente douradas. Pincelei 2 colheradas de mel de abelha rainha, fechei o apetitoso sanduba e dei a 1ª mordida:
Aleluia, oh glória!
Saboreei-o hávidamente temendo ser descoberto, embora fosse direito meu, ja que estava passando da hora do lanche diário. Resisti heróicamente para não comer o 2º enquanto ouvia as lombrigas gritando:
Mão de vaca, manda mais um!
A carne é fraca, confirmei que titia roncava na "sexta" diária e mandei pra dentro o 2º!
Estava aberta a porteira, a caixa de Pandora que liberou de saída a Fome, ou ela me matava ou....
Era guerra, não fiz reféns, assassinei uns 8 franceses, como era chamado na época aquelas "coisinhas fôfas", e só parei quando ouvi o motor do carro do Tio José encostando na frente de casa. Mesmo movido a pão consegui escalar a parede de casa sabe Deus como, indo me aboletar em cima do telhado, no ouvido a musiquinha:
Daqui não saio, daqui ninguém me tira!
O telhado ficava em cima da dispensa e deu para ouvi-la exclamar ao abri-la:
Mas não é possivel!
Tempos depois ela se vingou, precisei de sapatos e ele me deu o do Tio José uns 4 números maior!
Estudava num colégio (Escola Agrícola Lysímaco Ferreira da Costa/ 1965?) com uns 50 alunos e eu com aquele sapato do Bozo. Me recusei a voltar para a casa nos sábados seguintes, ja que era uns 10 km de pernada atravessando a cidade inteira, depois das 10 horas da manhã, hora que começava a dispensa!
Estranhamente minha Tia Anita criou 3 filhos de uma outra família que morava apenas 500 metros de sua casa. Quando cheguei só tinha o "primo" O...., (já tinha passado o "primo" A....) mais tarde chegou a "prima" I...!
Criada a moda antiga para ter um bom casamento, conseguiu.
Casou com um bancário e na vinda para o Rio de Janeiro meu "pai" me levou para vê-la na sua nova casa. Nos recebeu deitada num baby doll e nos serviu café em bandeja de prata com xicrinhas, idem. Detestei-a e áquela frescura toda até porque meu "pai" insistiu em me comprar um sapato para vê-la. Quem diria, aquela que era filha de criação tinha esquecido o passado dela. O "primo" O... criado a pão de ló enquanto este legítimo sobrinho aqui era o Gato Borralheiro da familia, não quis nada com o serviço indo parar até na cadeia!
E nos 4 anos que vivemos juntos minha tia insistia que eles (O.. e I....) fossem visitar seus pais, é só me lembro de uma visita:
Quando o pai deles morreu!
Velório na época era movido por 4 Cs:
Café, cachaça, cigarro e contar causos!
Não entrei para ver o caixão, mas na saída tive a nítida impressão de ver um vulto me seguindo, talvez porque a casa fica a uns 300 metros do tão temido cemitério!
Resumindo:
Uma adoção com amor substuitui qualquer mãe ou pai legítimo!