O mundo tá chato!
Quando alguém solta essa frase perto de mim, primeiro eu analiso se é comigo. Não sou uma pessoa que procura encrenca, mas eu gosto de analisar o perfil de quem solta certas palavras ao vento. Se for comigo eu faço uma pergunta: por quê? (eu sei que tem acento, decorei que quando está ao lado da interrogação vai um chapéu no "e", mas é separado mesmo?).
Já ouvi de tudo: "ai antigamente a gente podia chamar negro de macaco e ninguém se ofendia, eu mesmo já fui chamado de palmito, e daí?"; "qual a diferença entre traveco e travesti gente, é tudo a mesma coisa, ai mimimi..." e ladeira abaixo, escolhi essas por serem as mais absurdas. Aí vem uma coisa interessante. Já vi gente querendo ser contra sendo a favor. O mundo não está chato a diferença é que quando você faz uma piada racista, misógina, homofóbica, transfóbica, xenofóbica, machista e lá vai pedra. Você corre o risco de ter uma ação judicial movida contra a tua pessoa maravilhosa.
E eis que de repente surge alguém que diz "eu não tenho lugar de fala, mas você está errado". Errado para mim é essa interpretação errônea sobre o lugar de fala. Segue a linha de raciocínio do titio aqui. Tirar o lugar de fala de alguém é, por exemplo, eu bem branco, caucasiano, europeu dos olhos azuis, quem me dera. Subo num palanque para falar sobre como sofremos por conta do racismo. Me diz, qual...tipo...cara...não consigo nem pensar em uma frase que desenhe o quanto isso é absurdo.
Esse mesmo carinha branco como o leite que sai das tetas de Mimosa, quando presencia uma cena de puro racismo diz que não pode fazer muita coisa, pois não é o seu lugar de fala. Ah vá pro inferno, né? Quando me responderam as frases acima, eu muito educadamente tentei explicar o fardo histórico que essas palavras traziam. Eu fiz um curso sobre Andragogia que resumindo é aprender como ensinar adultos e me formei em pedagogia, que é quase que o contrário. Lição que não esqueço mais, o ser humano só cresce nas pernas e nós absorvemos melhor a informação associando ao conhecimento prévio, base do construtivismo, que vários docentes interpretam errado, mas isso é assunto para outro dia.
Sem mais delongas eu tento dar exemplos como: é justo fazer piada sobre o holocausto para uma pessoa que perdeu a família inteira em uma câmara de gás? Geralmente me respondem que não e é o que eu espero ouvir, pelo amor de Deus. Pois bem, pessoas já morreram por conta dessas palavras que um dia foram consideradas piada. Aliás, pessoas morrem até hoje embaixo dessas e de outros termos mais pejorativos ainda. Fazer piada com quem morre por conta de "licença poética" é o mesmo que o exemplo anterior.
Eu consigo obter dessas pessoas dois tipos de reação que podem variar muito pouco. Para o perfil de pessoa resistente, que é o que mais se enfrenta neste mundo, o sangue no corpo dela vai todinho para o crânio. Típico de seres que odeiam serem corrigidos não importa o quão errados eles estejam. Daí podem sair ofensas, frases chulas, tomada de temas que nada tem a ver com a discussão inicial e "taca-lhe pau".
O outro tipo de reação é mais fácil de lidar que é a mudança de assunto repentina. Nada aconteceu, você volta para sua casa pensando se aquilo de repente não foi um delírio. Pode ter sido na hora em que eu passei por aquela garotada fumando maconha, com certeza foi isso, fiquei doidão por tabela.
Se você é essa pessoa que usa essa frase "o mundo tá chato", te aconselho a se fazer esta pergunta: por quê? (ainda estou na dúvida, mas repeti, se eu errei eu aprendo e se eu acertei foram duas vezes).
Depois da sua justificativa mental, vá pesquisar se alguém sofre com isso. Geralmente a resposta é sim. E essa "sofrência" acontece há séculos. Você gostaria de ser tratado como essas pessoas que estão constantemente sendo alvo de piadas engraçadinhas do tempo do Didi Mocó? Pense, reflita, por que estamos em quarentena, olha aí uma atividade interessante para se executar nessa pandemia.
Eu acho muito bonito aquelas frases "não precisa ser gay para ser contra a homofobia", "não precisa ser negro para ser contra o racismo" e assim por diante. Eu resumiria em "não precisa ser nada além de humano para fazer a coisa certa", mas a empatia sumiu das prateleiras antes da cloroquina, então muita gente não vai entender a analogia tão pouco a ironia. E para fechar eu deixo aqui uma questão: "Mas e o PT?"
(...) "brinks"!