Palavras Indestrutíveis
Foram horas de insônia, aparando pontas, fazendo preenchimentos, limando, lixando, buscando um formato, escolhendo cores, polindo, e no final, admirando e desprezando.
Julgo-me vassalo das minhas ironias. Não sei se é defesa ou ataque, quem sabe um veneno gostoso de aplicar; em tantas vezes incompreensíveis para os outros. São, no entanto, frutos da minha indignação.
Sou um indignado com os egoísmos, dos outros e dos meus; com as injustiças das pessoas, das minhas e do mundo. Na procura do conforto e do gostoso, rejeita-se o bom, o bem e o belo. É um casamento perfeito; pratica-se de tudo para o bem, camuflando o mal; para a alegria, furtando-se às tristezas; para o sucesso espezinhando o próximo; para a riqueza, alargando a miséria.
Quis talvez, na minha imaginária escultura, transformar em cápsula esta palavra indignação, para que o meu estômago fizesse o que o meu pensamento e o meu coração não conseguem. Que conseguisse digeri-la e a eliminasse definitivamente.
Descobri finalmente, que a ignorância seria a solução. Pode ser que se eu me sentasse no colo da preguiça e me encostasse nos ombros da ignorância, o céu ficasse então mais azul, os meus olhos se tornassem cúmplices do meu otimismo e eu sepultasse para sempre a tal palavra.
Bobagem! A ignorância capaz de me pacificar não existe mais. Ela é diferente desta que nos rodeia. Ela não se banha e nem bebe desta água imunda. Ela não respira deste ar poluído. Ela não se interessa por mentiras e falsidades. Ela ouve o canto dos pássaros, observa o verde das matas, respira o perfume das flores, nada no remanso dos rios, seus bens não cabem em bolsos, carteiras ou bancos. Ela não existe mais. Santa é a minha indignação!