BOLÃO

Nas arenas intempestivas da sala de aula, um jogo da seleção brasileira no ano de 1998 foi assunto da semana, principalmente entre os mais fanáticos pelo futebol. Nesse meio eu também estava infiltrado à época, pois querendo ou não eu desafiava os gramados do estádio municipal semanalmente em um “colégio” do futebol.

Na semana anterior ao jogo da seleção canarinho, a turma inteira da 8ª série única do Nagem Abikahir estava em agitação anormal. A patotinha mais atrevida foi quem puxou o restante do bando e nos aglomeramos ao meio da sala de aula para um anúncio inusitado. Decidimos fazer um bolão meio fajuto valendo bombons serenata. Muita gente se valendo de um patriotismo extremo, de um amor inabalável pela camisa da seleção, acreditou em uma vitória recheada de gols do Brasil contra a Argentina. Alguma coisa me dizia, porém, que desta vez não seria um momento propício para uma vitória brasileira, mesmo o jogo sendo no “Maraca”, um dos maiores estádios do planeta e palco de jogos memoráveis.

Para acirrar mais a disputa no bolão alguém sugeriu, além do placar, citar os nomes dos goleadores. Dessa forma, matutei bem toda estratagema envolvendo o jogo que seria nos próximos dias e soltei logo meu placar e o marcador. Seria 1x0 para a Argentina, gol de Batistuta, o cara era terrível no ataque argentino, não tinha como não ser ele o marcador da noite. Alguém, rebelde como eu, havia igualmente apostado em um placar desfavorável para a seleção brasileira, um 2x1 para a Argentina, mas ficou em cima do muro quanto aos craques que selariam a vitória da seleção “de la plata”. Depois de tudo organizado em uma folha amassada de caderno as aulas retomaram e a ansiedade tomou conta da alma dos ávidos torcedores.

Na semana posterior, já com a partida finalizada, a sala de aula lembrava o tumulto de estádios de futebol, pois nós alunos estávamos em uma algazarra de vozes fundidas querendo acesso àquela folha amassada e encardida. Infelizmente, não consegui acompanhar a todo jogo da seleção e repousei em um sonho recheado de bombons serenata. Fui deitar, o placar estava tudo igual, 0x0. Mas naquela muvucada da turma eu sentia que havia errado o resultado do jogo. Enfim, informaram que a partida ficou 1x0 para a Argentina e o gol foi de Cláudio Lopez. Por um surto de esquecimento ou mesmo de esperteza do meu rebelde companheiro de vitória argentina, ele foi reclamar que valia na aposta apenas vitória ou derrota, não placares e marcadores. No fim das contas, ele levou metade dos serenatas e eu a outra. Não era muita coisa, mas já dava para adoçar a refeição do recreio de logo mais.

Nesse dia aprendi que, além de outras experiências, possuo potencial para ser vidente, o “Pai Jão”, apesar dos erros técnicos inerentes à essa atividade de prever acontecimentos. Tudo não passa de estatística, percentuais. Existe sempre aquele 1% que lhe acomete todo um trabalho semanal de observação e análise de cenários, além, claro, de visões noturnas sonhando com bombom serenata.