Minha fobia social ou, antropofobia??
O embate entre o subconsciente e o consciente
Quase uma década atrás, comecei a apresentar problema de insônia, causado por um excesso de atividade introspectiva, e ainda com tique nervoso de piscação frenética dos olhos, fazendo com que passasse a usar óculos escuros, hábito que nunca foi do meu feitio. Achei que fosse ficar louco, que não conseguiria superar aquele estado lastimável no qual me encontrava. Então, num certo dia, consegui ter a primeira noite de sono, depois de, sei lá, quase um mês em claro.
Meu subconsciente havia saído do controle. Foi aquilo que constatei. Havia esquecido que dormir obedece ao mesmo mecanismo básico que falar, de acontecer sem que se tenha absoluta consciência. Por isso que passei a chamar a insônia de "gagueira mental". Quando eu tentava dormir, naquele período de sofrimento, ficava muito ansioso para o sono chegar, o principal erro de todo insone crônico.
Pois algo mais permanente também acontece comigo, só que em relação à minha fobia social.
E então eu me pergunto, por que algumas pessoas têm fobia social?
Ou seria antropofobia?
Não sei quanto a elas, mas em um dia qualquer e longínquo deste em que vos escrevo este texto, meu irmão me disse que eu tenho "medo de gente". Na hora, me senti ofendido mas, depois de um tempo, percebi que foi um grande insight dele sobre mim. Também comecei a trabalhar a ideia de não estar tão errado por reagir desta maneira, porque é comum culpar o portador de um transtorno mental por tê-lo ao invés de pensar se não existe qualquer lógica em seu comportamento e a partir de seu contexto. Primeiro que, ninguém em sã consciência gostaria de desenvolver quadros psicossomáticos que reduzem sua capacidade de adaptação dentro da sociedade em que vive. Dizer que é culpado é o mesmo que dizer que quis estar nesta situação. Segundo que, ao analisarmos criticamente a humanidade, podemos chegar à conclusões não muito simpáticas ou mais realistas sobre ela, que justificariam em partes ou até predominantemente a fobia social, dependendo do histórico e intensidade de situações traumáticas vividas pelo indivíduo. Sim, a humanidade, em termos gerais, tem se comportado de maneira bastante problemática, aquém da racionalidade que diz possuir, do nome científico "homem sábio" que diz ser, em suposto contraste às outras espécies.
Pois, se abrirmos um livro de história, iremos ver e ler sobre séculos e mais séculos de opressão, crueldade e estupidez, com momentos isolados de avanços do pensamento humano, de ilhas de genialidade e razão em meio a um oceano agitado de problemas resolvíveis que se acumulam erraticamente.
Em pouco tempo de convívio com humanos, meu subconsciente concluiu que se consiste em uma atividade de risco, de irracionalidades, até mesmo à possibilidade de agressão física sem justa causa, ao invés de insistir no pensamento positivo de que a maioria é idealmente confiável e cortês.
Sensível ou mentalisticamente analítico??
Apenas uma interação interpessoal, a priori, trivial, pode desencadear uma série de questionamentos e reflexões em minha mente. Por exemplo, se eu ando na rua e alguém age de maneira hostil comigo, ao invés desta situação escorrer de minha consciência, logo depois de vivenciá-la, pode me impactar a ponto de estendê-la por um misto de emoções logicamente correspondentes e análises sobre o ocorrido. Também posso internalizar o que vivi enquanto reforço de um lembrete aprofundado, de que existe uma elevada chance de ser hostilizado sem ter qualquer razão racional cabível e que o ideal, ainda mais para essas terras densamente ocupadas por gente limitada, é o de racionar minhas interações. Tal como uma espécie de ser vivo não-humano que se exila distante da presença perniciosa de humanos.
A paranoia e a igualdade de tratamento
Para o paranoico, somos todos iguais diante de sua sensação de estar sendo perseguido, se o que mais lhe importa não é quem fala mas o que falam dele. Falo isso por experiência própria, porque a fobia social ou, minha antropofobia, tende a aumentar a frequência de ideações paranoicas a partir desses "lembretes da mente".
Imagine se você estivesse dentro da ilha Nublar rodeado por dinossauros das mais diversas espécies, principalmente de carnívoros?? Seu medo de ser encurralado e morto seria logicamente grande. Ok, a comparação com o filme Parque dos dinossauros não é perfeita, mas rusgas e conflitos desnecessários estão à minha espreita pelas esquinas das interações humanas. Minha necessidade pelo respeito e pela racionalidade é tamanha que eu não posso me rebaixar a este nível de inteligência que predomina nas relações sociais brasileiras, por considerá-los e por serem o básico para quem se define humano, especialmente a racionalidade (ou deveria ser).
Independência mental e prepotência
Outra observação é de que, por estar tão bem comigo mesmo, não sinto grande necessidade de densa socialização, o que por um lado pode ou tem resultado na perda de um aprendizado e consequente naturalização de uma rotina desse tipo. O que percebo em mim é que, se eu fico mais tempo dentro de casa, desaprendo o que havia naturalizado quando saio à rua, por exemplo, de ver muitos rostos e isso necessariamente não gerar ideações paranóicas. Porém, estar com os meus amigos reduziu esta sensação de absoluta independência em relação ao conviver.
Pessoas irracionais me irritam e também me fazem sentir superior a elas. Meu senso autoconsciente de superioridade ao outro, pelo critério da racionalidade, e por divergências culturais e comportamentais, também são fatores que reforçam minha necessidade de isolamento predominante e/ou de seletividade restrita de interação social.
Pragmatismo filosófico e hedonista
Ser respeitado, bem tratado e, claro, com reciprocidade, está relacionado à sensação de prazer, que é aquilo que sempre buscamos enquanto vivemos. Pois também some a isso a minha natureza existencial, minhas veias de filosofia e pragmatismo, e o resultado é um aumento de razões para ser antropofóbico ou, com determinadas espécies de seres humanos, abundantes no rincão onde estou. Ao perceber que tenho mais chances de ser injustiçado pelos outros, ainda mais em um país onde o crime compensa, como o Brasil, especialmente se você tiver dinheiro e contatos, eu pragmatizo que não há razão para me jogar nessa selva. Pelo contrário, que preciso me defender, ainda mais no meu caso, por ser muito sensível e intolerante com a irracionalidade. Minha veia filosófica me faz focar nas pequenas coisas da vida que são as mais significativas. Meu compromisso com todo dia, meu senso de hiperrealismo, de saber que a vida é no agora, finita, frágil e absoluta, reduzem de maneira considerável minha tolerância por este viver em competição, alienação e/ou dinheiro.