PREMONIÇÕES?
Nas velhas infância e adolescência e até mesmo recentemente, já adulto, com poucos fiapos brancos cobrindo meu crânio e as rugas trazendo estranho charme ao meu rosto, os sonhos governam meu universo noturno sob as cobertas. De olhos muito bem fechados e alma relaxada, a mente me teleporta a um mundo paralelo que pode ser bom ou ruim. Não sei muito bem os controles fisiológicos e bioquímicos desse processo, mas é interessante que algumas vezes pareço estar em um jogo de realidade virtual. Outras vezes me espanto com a sagacidade mental de transferir um plano fantasioso para uma experiência existencial. É sobre minhas vivências no laboratório de “Morfeu”, provenientes de sonhos recorrentes, que irei detalhar abaixo meu mundo íntimo de sonhos. Já comunico para não se atemorizarem.
Ao final da infância e início da adolescência, inauguração da minha carreira futebolística em solo iunense, ao cair da noite e já perambulando as névoas da madrugada, pelo menos quatro dias por semana, minha mente sempre me conduzia a um pesadelo com mesmo tema e mesmo enredo. Eu era jogado em cenários tempestuosos e de gente desesperada. Muitas vezes eu tentava acudir aquelas pessoas, ajudar numa fuga frustrada, pois quem vinha logo ali de forma avassalador era um vendaval jamais visto e raios caindo por terra inteira, ferindo solos férteis e atacando sem dó, nem piedade a valentia e vigorosidade de imensos paredões rochosos. Em outros momentos nesse palco, tomado por um extremo desespero, esbravejava e esguelava gritos que ficavam presos na minha garganta por todo medo causado por aquele escarcéu. Essas aventuras por mundos insanos parecem ter se encerrado a partir do temporal que desmoronou sobre Iúna no ano de 1998, foi terrivelmente devastador. Não com a intensidade dos pesadelos, mas vieram tudo ao mesmo: chuva muito forte, ventos severos, raios e granizo aos montes.
Já em minha vida juvenil, lá pelos 20 e poucos anos na cacunda, barba na cara e marmanjão, os pássaros de aço eram quem me conduziam para o universo de pesadelos. Mudaram-se o tema e o cenário, bem como os objetos ali inseridos. O que “Morfeu” está tramando? Já havia virado rotina nas minhas noites de “descanso” as projeções perturbadoras que minha mente me enfiava. Dessa vez, os aviões eram os principais objetos cruzando a imensidão azul dos céus e noutros momentos se detalhavam em noites estreladas. Inevitavelmente, em algum instante do trajeto, eu percebia um movimento brusco da aeronave que eu julgava incorreto. Tomado por esse ensejo eu sempre dizia a mim mesmo naquela fantasia “aquele avião vai cair”. E de fato, como era recorrente, cíclico e nada surpreendente, os pássaros de aço se espatifavam no chão, se destruíam por inteiro em chamas ou sem chamas. Era um pesadelo horrível em todas as ocasiões. Talvez esses sonhos aflorassem em resposta a um medo arrebatador de trafegar pelas estradas aéreas. Entretanto, essas ilusões criadas pela minha mente tiveram fim nos mais tristes episódios da história da aviação nacional, os acidentes da Gol de 2006 e da TAM em 2007. Foram acontecimentos difíceis de deletar da memória e de digerir mentalmente.
Ultimamente, o “Morpheu” tem estado sossegado no meu universo infinito de sonhos. Não sei o que lhe aconteceu para estar tão “zen” nesses últimos anos. Temos, enfim, um convívio harmonioso nas entranhas misteriosas de mundos paralelos.