A PRIMEIRA CASA DELA

A PRIMEIRA CASA DELA

Marília L. Paixão

Era uma casa de dois cômodos bem pequenininha. Na entrada principal desta casa havia um fogão. Havia uma mesa, mas não me lembro se haviam quatro cadeiras, mas creio que sim. Os móveis eram emprestados de uma amiga recém separada e que estava passando uns tempos em outra cidade. Certamente ela tinha mesa com quatro cadeiras assim como o fogão era de quatro bocas. Sofá não tinha vindo. Não iria caber naquela sala onde também tinha a geladeira que não era nem velha e nem nova. E a televisão? Ficava também nesta sala ou tinha seu lugar no segundo cômodo, o quarto? Vou precisar fazer uma viagem, rever pessoas que me ajudarão a voltar no tempo para que os detalhes me voltem à cabeça. Só do coração que as coisas não saem. Não saem não. O banheiro desta casinha ficava do lado de fora. Era o mesmo banheiro das outras duas vizinhas, tão diferentes e de vidas tão parecidas. Só a vida de quem morava na casinha menor, de dois cômodos era a mais diferente de todas. Ninguém entendia o que aquela vida estava fazendo ali. Os vizinhos do lado de fora da rua e os de frente do outro lado da rua eram de universos diversos. A vida dessas pessoas tinha algo em comum bastante visível. O que ela havia reparado primeiro era que elas pareciam começar o corre-corre da manhã no mesmo horário. Um rádio era ligado alto e ninguém reclamava. Parecia o despertador de todo mundo. A rua era pequena. Na verdade era um finzinho de rua que ia dar em uma balsa que atravessava o rio. Aquele pedacinho de rua nem era calçado e aquelas pessoas se não muito riam também não choravam. O sol parecia igual pra todos e todos transpiravam nos dias quentes. As duas vizinhas da casinha do meio eram solteiras e não tinham filhos. Não tinham ainda... A vizinha branca, mais nova, suspeitava de gravidez. Tinha um caso com o dono do restaurante onde trabalhava. A vizinha bem escura e lustrosa super vaidosa e que não trabalhava fora tinha mais tempo para conversar e reparava muito na vizinha da casinha menorzinha que ficava no meio. Eram as três casinhas separadinhas, do mesmo dono, no mesmo lote e cada uma com um aluguel diferente. Cada uma sabia o preço que cada uma pagava e quais as diferenças dos cômodos e dos acabamentos. A moça da casinha do meio fez amizade logo com a vizinha morena, afro descendente, mas naquele tempo não existia este vocabulário. A própria gostava de se referir a ela como nega mesmo! Era alegre e bem humorada. A primeira conversa começou pelo banheiro. Já que era um banheiro só para as três, bem que podia ser maior e com um acabamento menos pobrezinho. De qualquer forma ele vivia limpinho. Nunca tiveram problemas por causa da higiene dele. Sempre houve harmonia naquele recinto. Ninguém entrava feliz e saia com raiva de dentro dele. A nova moradora da casinha do meio era a mais novinha. E ninguém até então sabia o que ela estava fazendo ali. Era branca, nem feia nem bonita ou mais bonita que feia cara de menina ainda... Tinha o olhar cheio de brilho e parecia que nada entendia da vida. E se perguntassem se ela era feliz, ela dizia que era.

Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 14/10/2007
Código do texto: T693710
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