NOITES DE CADEIRAS NA VARANDA
NOITES DE CADEIRAS NA VARANDA
Marília L. Paixão
Muitas vezes antes de escurecer eu me protegia da criança que se afligia dentro de mim.
Era tímida e o escuro me enchia de medo. Depois compreendi que era culpa dos fantasmas das histórias de roça que minha mãe contava. Ela contava dessas histórias de mortos que apareciam a lhe atormentar o sono. Uma vez ela contou para uma vizinha de como o meu avô se rastejou até ela pedindo que não tivesse medo e lhe tocou a face com as mãos mais frias. Meus olhos arregalados a essas histórias ouviam perto da hora de ir deitar. Então ia para cama sozinha a me torturar com as sombras desses mesmos fantasmas pedindo a Deus para que eles não me tocassem. Nessa época eu ainda tinha a preocupação de rezar. Era um hábito não muito bem orientado, mas existia. Tinham me ensinado a dizer que se alguém perguntasse qual era minha religião, a resposta era “católica!” Era capaz de urinar na cama se não passava o medo.
Mas vinham outras noites de cadeiras na varanda e depois que brincava com as outras crianças, me aproximava para ver se o papo tinha chegado nessas histórias estranhas em que minha mãe contava esses sonhos tão reais que tinha com o meu avô. Eu nem lembrava dele vivo. Devia ser muito pequenininha quando ele morreu. Ela dizia que não era sonho. Que devia ser espírito.
Lembro de uma história que não era com o avô. Era com um ser de outro mundo. Lembro que ela disse que ele era muito negro e tinha olhos vermelhos... Aquela noite provavelmente eu não dormiria. Meu coração morria de pânico escondido. Ficava por ali fingindo que não ouvia. Minha mãe era muito brava e criança não podia escutar conversa de gente grande.
Ela começou a contar que não parecia estar dormindo. Que parecia estar acontecendo de verdade. Mas era madrugada. Que aquele ser veio entrando pelo seu quarto e meu pai ali dormindo ao seu lado. Ela aterrorizada chamou por ele, mas ele não acordou. O tal homem estranho, muito negro dos olhos vermelhos se aproximava e ria com olhar zombador. Minha mãe tentando acordar meu pai dizia: - João, pelo amor de Deus, acorda João!
De tanto medo já tinha me arrependido de estar ali ouvindo aquela história e senti o xixi me descendo pelas pernas e o vi escorrer até a cadeira da minha mãe. Ainda gelada de susto não estava bem certa do que estava acontecendo. Mas minha mãe tinha interrompido o caso que estava contando e estava me batendo.